Nunca li mais de três páginas de um livro de ficção do Lobo Antunes. Fico no entanto sempre tocado pelo brilho no olhar que os seus leitores exibem quando falam do seu autor preferido. Estou também fascinado pela personagem Lobo Antunes. A maneira como ele fala da sua vida e em particular da sua entrega ao trabalho é impressionante.
Como diz a Maria da Conceição, cada um de nós carrega a sua cruz. Como Cristo era homem, é natural que as cruzes das mulheres sejam maiores. Se não esquecermos este facto, podemos falar por uma vez da cruz de um homem. Um homem que admite estar no purgatório em vida para expiar os muitos pecados que cometeu. Os maiores de entre eles todos ligados à Maria José. Se julgava que já estava perto do fim do seu calvário, enganou-se.
As suas filhas desenterraram do baú as cartas que ele escreveu à mãe durante a Guerra. Aquele assunto de que ele não é capaz de falar. Nem nos livros, nem nas entrevistas. Terão elas consciência do que estão a fazer? Será uma punição? Será apenas um capricho?
As filhas devem ter-lhe pedido autorização para publicar as cartas. Que podia ele fazer? Não tem mais nenhumas.
Doía ver as entrevistas a Lobo Antunes quando da apresentação do livro:
Está contente?
...
Releu as cartas? Corrigiu-as?
Não li.
Lembra-se do que está lá escrito?
Não.
Está a pensar em relê-las quando?
Não estou a pensar nisso.
Resignado como um boi à entrada do matadouro, o António aceitava o seu destino. Mais um passo da sua via sacra.
Consumidor ávido de toda a obra não literária do António, desta vez não vou comprar o livro. Por pudor. Uma palavra que o António tantas vezes usa. Uma palavra cujo significado não conseguiu transmitir às suas filhas.
Como diz a Maria da Conceição, cada um de nós carrega a sua cruz. Como Cristo era homem, é natural que as cruzes das mulheres sejam maiores. Se não esquecermos este facto, podemos falar por uma vez da cruz de um homem. Um homem que admite estar no purgatório em vida para expiar os muitos pecados que cometeu. Os maiores de entre eles todos ligados à Maria José. Se julgava que já estava perto do fim do seu calvário, enganou-se.
As suas filhas desenterraram do baú as cartas que ele escreveu à mãe durante a Guerra. Aquele assunto de que ele não é capaz de falar. Nem nos livros, nem nas entrevistas. Terão elas consciência do que estão a fazer? Será uma punição? Será apenas um capricho?
As filhas devem ter-lhe pedido autorização para publicar as cartas. Que podia ele fazer? Não tem mais nenhumas.
Doía ver as entrevistas a Lobo Antunes quando da apresentação do livro:
Está contente?
...
Releu as cartas? Corrigiu-as?
Não li.
Lembra-se do que está lá escrito?
Não.
Está a pensar em relê-las quando?
Não estou a pensar nisso.
Resignado como um boi à entrada do matadouro, o António aceitava o seu destino. Mais um passo da sua via sacra.
Consumidor ávido de toda a obra não literária do António, desta vez não vou comprar o livro. Por pudor. Uma palavra que o António tantas vezes usa. Uma palavra cujo significado não conseguiu transmitir às suas filhas.
20 comentários:
Também fiquei espantada quando vi o livro em exposição nas livrarias. Quase tive medo de lhe tocar, abri-o apenas para ver quem era o autor. Acontece-me o mesmo que a ti: não vou comprar o livro, por respeito para com António Lobo Antunes.
A sério?! Eu vou. Este projecto não é dele. É das filhas. Ele nunca iría tomá-lo como seu. Não é resignação. É "Quero lá saber do que vocês (que fazem perguntas) estão para aí a dizer."
Acho absolutamente deliciosa, a ideia de ler o que Lobo Antunes escreveu sem filtros.
A sério?! Eu vou.
Calculava que sim.
Este projecto não é dele. É das filhas.
A sério? ... Não tinha reparado :)
Acho absolutamente deliciosa, a ideia de ler o que Lobo Antunes escreveu sem filtros.
Uma forma mais sofisticada de dizer: porque é que a Olá nunca meteu o nariz na vida do António?
As cartas são certamente um documento admirável sobre a guerra. E existem tão poucos!
Só deviam ser publicadas depois da morte do LA. Embora isso não permitisse aos seus contemporaneos que as lessem.
Se ninguem lesse o livro, o LA não tinha a oportunidade de expiar mais uns bocados. Convém que tenha, porque foram muitos.
Apenas espero que quem leia o livro fique a perceber que está a meter o nariz onde não devia. Só terá a ganhar em se penitenciar o mais rápido possível.
Já agora: este post, como Os Sopranos, é para maiores de quarenta.
Na verdade, eu não acredito na penitência.
Maiores de quarenta?!
Quarenta quê? Livros? :)
Se a Olá (Só conheço os gelados, com este nome, por acaso. Lembrei-me da Hola. Será por aqui?)) nunca meteu lá o nariz, não foi, com toda a certeza, por falta de tentativa ou interesse. António Lobo Antunes É um génio. E é um homem diferente dos outros. Será por isso que suscita tantos pruridos? Se pudesse, devorava toda a informação da vida dele. Não por cusquice. Porque gosto dele. Por interesse. Por querer saber mais sobre ele. Certamente que algumas pessoas que lerem este livro, o farão com esse mesmo objectivo. Outras, nem por isso. É a vida.
Acho que o nosso querido Duarte Nuno disse uma vez que a Hola era a Olá portuguesa. Deve ter havido uma revista com esse nome.
Mais de quarenta anos. Não foi por acaso que a M assinou por baixo.
Peço desculpa pela intromissão, nesse caso.
Ó On, tu às vezes és delicioso.
Tenho mais de quarenta por isso cá vai:
Também me assaltou a mesma espécie de pudor, que tu manifestas no post. Mas...
Eu não vou ter os problemas que o António L. Antunes, porque o que escrevi não vale um caracol, e aliás, já destrui. Mas disso tenho que me penitenciar, (cá está, penitência)porque tudo o que escrevi, o que fiz, o que disse, de algum modo, já não me pertence. As minhas filhas são herdeiras, dessas mesmas coisas (será só o que lhes deixo).
O amor, meu caro, é sairmos de nós mesmos. No amor perde-se a propriedade própria.
Agora iria dizer uma enormidade: quem é pai ou mãe é capaz de perceber melhor isto. Disse.
E de mais: "todas as cartas de amor são ridículas"
Num momento de grande fraqueza, destrui as minhas, todas. Parva, convencida.
Ai, a minha cruz!
Quem tem mais de quarenta anos, é provavel que entenda o post de outra forma. Só isso...
Já disse que não acredito na penitência. Também não acredito no pudor.
Um dia, também hei-de ter mais de quarenta anos... e hei-de voltar aqui para comentar! Nessa altura, bastar-me-á fazer "copy" seguido de "paste". You'll see! :)
E acho que a penitência e o pudor também não acreditam em nós... :)
No dia em que as criancinhas começam a dizer de sua justiça, as coisas mudam.
De sua justiça, de sua justiça! Já mudaram?
As SUAS criancinhas, minha senhora.
" (...) porque tudo o que escrevi, o que fiz, o que disse, de algum modo, já não me pertence. (...)".
Concordo, MC. É isto. Mas, na minha opinião, nem às minhas filhas pertence. É de toda a gente. Se eu quisesse que ninguém soubesse o seu conteúdo, não tinha escrito.
Bom dia! O sol brilha e está frio.
Podias publicar no teu blog a password da tua conta de email.
O meu email é meu. Não o ofereci a ninguém. Existe para mim. Além disso, o que lá está reporta a factos muito recentes da minha vida, que ainda não estão ultrapassados. Seria o mesmo que contar a toda a gente o que se passa na minha vida, actualmente. Há um tempo para tudo. Pelo contrário, o que escrevi para outras pessoas, é delas e das pessoas que são delas. Desde que me informem e paguem direitos de autor, publiquem à vontade. :)
E, finalmente, eu não sou tão interessante como LA. Nem por sombras.
Eu não vou comprar o livro, e não é por respeito pelo Lobo Antunes, mas simples respeito por mim própria.
Uma carta de amor não é um papel lançado aos quatro ventos, é um acto de profunda confiança numa pessoa única. Se essa pessoa não sabe estar à altura da confiança, lamento profundamente por ela. Mas não me faço cúmplice da devassa.
Do mesmo modo que não li os detalhes da vida sexual do Clinton quando esteve à disposição de todos na internet, nem sequer quis ouvir anedotas sobre o assunto.
Penso que as pessoas, mesmo as pessoas célebres, têm o direito a ser respeitadas na sua esfera privada. Recuso-me a aceitar que a ocasião faz o ladrão - aqui em casa, ninguém lê cartas, ou sequer postais, que não lhe foram destinadas.
Já tenho mais de 40 anos, li o livro e cumpro as minhas promessas.
Eis o copy/paste:
A sério?! Eu vou. Este projecto não é dele. É das filhas. Ele nunca iría tomá-lo como seu. Não é resignação. É "Quero lá saber do que vocês (que fazem perguntas) estão para aí a dizer."
Acho absolutamente deliciosa, a ideia de ler o que Lobo Antunes escreveu sem filtros.
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Maiores de quarenta?!
Quarenta quê? Livros? :)
Se a Olá (Só conheço os gelados, com este nome, por acaso. Lembrei-me da Hola. Será por aqui?)) nunca meteu lá o nariz, não foi, com toda a certeza, por falta de tentativa ou interesse. António Lobo Antunes É um génio. E é um homem diferente dos outros. Será por isso que suscita tantos pruridos? Se pudesse, devorava toda a informação da vida dele. Não por cusquice. Porque gosto dele. Por interesse. Por querer saber mais sobre ele. Certamente que algumas pessoas que lerem este livro, o farão com esse mesmo objectivo. Outras, nem por isso. É a vida.
:)
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