segunda-feira, dezembro 19

O som do que não se diz (II)


"Racism, of course, is not possible without a concept of race."- Robyn Conder Broyles


Vamos supor que negávamos a validade científica do conceito de "raça" e baníamos dos documentos oficiais qualquer referência a esse conceito. Isto não é ficção, é um dos bastiões de certas facções do politicamente correcto.

Uma vez tomado tal passo há uma miríade de medidas que não podem ser, não só tomadas, mas mesmo enunciadas em tais documentos. Há um conceito que desaparece de discussão porque não tem nome. Isto é totalmente artificial porque, "cientifico" ou não, o conceito de raça está presente nas mentes dos cidadãos, e constrange as suas interacções. Não desaparece do terreno por desaparecer do papel.

Mas agora tome o passo seguinte: proíba a menção do conceito (tornando esse simples acto como "hate crime" - note-se que não utilizei a palavra "racismo" já que não há "raça") em livros escolares, artigos de jornal, etc. Censure-o da televisão sempre que alguém o mencione em entrevistas de rua. Se fizer isto bem feito ao fim de uma geração ou duas a palavra e o conceito serão apenas usados por meia dúzia de velhotes "reaccionários" e decrépitos, e apenas às escondidas. Conversa de velhos senis!

Deixa de se poder falar de uma data de coisas. Certas frases deixam de ser compreendidas pelas novas gerações, donas de uma linguagem mais pobre. Certos comportamentos de grupo e afinidades e hostilidades mútuas tornam-se ncompreensíveis. Mas será que desaparecem?

Há quem diga que sim. Desprovido de nome, o problema esfuma-se magicamente. Na minha opinião, tal não tem funcionado, não dá mostras de vir a funcionar, e ainda que funcionasse não pagaria o preço de sermos cada vez mais uma carneirada acéfala e cobarde. Trata-se de novo de escolher: enfrentamos o mundo livremente, corajosamente, conscientemente, ou protegemo-nos, dando em troca a nossa liberdade de pensamento e de acção, e a nossa coragem?

É de novo a velha escolha entre liberdade e segurança...

10 comentários:

António Araújo disse...

O Prozacland sofreu momentaneamente um instante de esquizofrenia editorial, (ou de sincronia Jungiana) :)

A quem reparou, as minhas desculpas :)

A quem não reparou: don't ask :)

Este post esta aqui por completude, e por sugestão do ON, mas o assunto ja foi discutido (ou está a sê-lo) até à morte no post do "politicamente correcto", de sexta-feira.

Sofia disse...

Eu reparei! :)

E ia comentar no de cima

"Desculpe, importa-se de repetir?"

Já não fui a tempo. Uma pena, porque era um excelente comentário, digno de uma loira.

Sofia disse...

Escolha entre liberdade e segurança? Qual segurança? Existe segurança, sem liberdade? Onde?

António Araújo disse...

Numa cela acolchoada de um hospício. Há quem goste. :)

"Those who would give up essential Liberty, to purchase a little temporary Safety, deserve neither Liberty nor Safety."
-Benjamin Franklin

Algo a considerar também no contexto da presente guerra aos direitos dos cidadãos, digo, ao terrorismo.

António Araújo disse...

>Já não fui a tempo. Uma pena, porque era um >excelente comentário, digno de uma loira.

Não te preocupes, apesar da gurva de Gauss do QI das loiras estar desviada para a esquerda em relação à curva de Gauss do QI dos seres humanos, isso é apenas uma afirmação de cariz estatistico. :)

Tu não és uma estatistica, tu és uma pessoa! Bem, uma loira...:)

Orlando disse...

Durante a discussão do post "Politicamente correcto" o OMWO apresentou um exemplo do programa politicamente correcto. Eliminar certas palavras do nosso lexico, como a palavra "raça".

http://www.un.org/WCAR/durban.pdf

é um um link para o site da ONU onde se vê o texto das conclusões de uma conferência sobre racismo organizada pela ONU onde se propõe precisamente isso.
Felizmente o bom senso prevaleceu e a ONU acabou por eliminar a frase

"Any doctrine of racial superiority is scientifically false, morally condemnable, socially unjust and dangerous, and must be rejected along with theories wich attempt to determine the existence of separate human races."

da declaração dos direitos humanos e do genoma.

Orlando disse...

O meu grande amigo Setúbal fez várias intervenções defendendo a não cientificidade do conceito de raça. Perguntei-lhe:

"Pode-se conceber que exista um definição científica de raça humana ou isso está interdito? Se a resposta é não, não nos autorizas a responder à tua questão:)"

Não obtive resposta. O que me parece muito estranho, especialmente vindo de quem vem. Mas o Setúbal não está sózinho nesta posição. Alguns grandes biólogos dizem exactamente o mesmo. Vou discutir o assunto, mesmo sem autorização do Setúbal.

lb disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
lb disse...

Ainda recentemente esta lógica ficou patente num post de Henrique Raposo, do Acidental, que provocou alguma polémica. Ele disse que não há homossexuais mas só comportamentos homossexuais. Contra os últimos, não tinha nada, desde que exercidos em privado. Generoso e tolerante, não é?
Duma penada retira não só a legitimidade, mas até sentido de qualquer afirmação social das pessoas com inclinação para comportamentos homossexuais, pois essa inclinação deixa de poder ser elemento de identidade.

Neste caso, foi usado um argumento PC para contrariar um movimento cujo apoio actualmente consta como uma bandeira do PC.

António Araújo disse...

É claro que a reconstrução linguistica não é uma invenção do Politicamente Correcto. Apenas foi aí que tomou contonos mais absolutos e ridiculos. Mas a um nivel menor é típica das várias facções políticas, especialmente das que possuam nas suas fileiras uma grande densidade de intelectuais humanistas com demasiado tempo nas mãos :)

Exemplo de uma conversa com um amigo, apoiante da CDU:

Ele: O João, aquele camarada que te apresentei, disse-me que aquele tipo ali tem umas posições um bocado raccionárias.

Eu (com ar de tradutor): Ah, O João, aquele teu amigo que me apresentaste, disse-te: "não gosto nada daquele tipo".

:)