quarta-feira, março 30

Geometric models of matter - Athiyah na Gulbenkian

Da outra vez que o Sir Michael veio a Lisboa, fiquei impressionado com a sua energia extraordinária. Chegou de manhã, deu um seminário, falou com toda a gente que tinha alguma coisa para dizer. Continuou a falar a uma velocidade louca durante todo o jantar, sem se preocupar com as horas. No dia seguinte tinha um avião para apanhar às sete da manhã, onde um dia ainda mais agitado o esperava em Barcelona. O conteúdo científico de seminário não me ficou na memória. Afinal o Athiyah tinha setenta anos e a Matemática é suposta ser um young man's game.
Fui até à Gulbenkian sem grandes expectativas. Aos 82 anos o Athiyah passou a falar à velocidade de uma pessoa normal. O seu seminário, esse não tinha nada de normal. Deu uma das palestras mais loucas e belas a que assisti em toda a minha vida. O homem quer asssociar a cada particula elementar uma variedade de dimensão quatro e por as ideias do Donaldson a render. As partículas de carga nula são variedades compactas. As ideias são tão belas e complexas que é difícil não ficar entusiasmado. O objectivo: refundar a Física Nuclear. Compreender a fissão e (suponho eu) a fusão nuclear. Trata-se de um tema tabu falar na fusão, mas não acredito que ele não sonhe com isso.
Está claro que no fim foi bombardeado pelos físicos: então e os quarks? e o neutrino? Ele tinha resposta para quase tudo. Só o Tom Girard é que conseguiu marcar um ponto quando levou o Athiyah a reconhecer que ainda não sabia muito bem que fazer com o fotão, embora tenha apresentado boas razões para que essa seja a última peça do puzzle.
Caramba, o homem ainda nem publicou o primeiro artigo. O mais impressionante é ver um gajo de 82 a falar de um projecto para vinte anos (a primeira fase!) com a energia de um pos-doc. Não é caso único: este ano vou à conferência dos oitenta anos do Hironaka, que continua a correr atrás do teorema de resolução de singularidades em caracteristica positiva com se de tal necessitasse para obter a tenure.
Velhos são os trapos!

domingo, março 27

Regicídios

Quando as cheias do Nilo não eram propícias durante vários anos, nada como matar o Faraó. Um rei é um símbolo da Vida. Quando deixa de encarnar esse princípio, havia que substitui-lo. O Sol tem de se por para voltar a nascer. O rei morreu, viva o rei. Em muitas civilizações mais primitivas procedia-se ainda à morte ritual do rei ao fim de um número fixo de anos do seu reinado. Algumas vezes era o próprio rei que se suicidava em frente dos seus subditos. O assassínio do rei Carlos e do principe herdeiro é uma manifestação tardia dessa mesma crença. Afinal Buiça era um monarquico.
Há muito tempo que os reis arranjaram maneira de se livrar desse incómodo. As eleições são um ritual que apazigua as massas. Em último caso os verdadeiros reis até deixam que os seus testas de ferro vão parar à prisão. Se for absolutamente necessário. Isto tudo para dizer que não partilho o entusiasmo que tenho entrevisto nas palavras de pessoas que deviam ser capazes de ver mais longe. Substituir Sócrates por Passos Coelho não vai resolver nada. Garantida a derrota do PS, até considero a hipótese de votar neles para evitar uma maioria absoluta.