Dizia-me um colega muito bem informado. Nos últimos dias do anterior governo Socrates veio cá para fora a habitual enxurrada de decretos-lei. Uma delas revoga nas entrelinhas o essencial das leis que obrigam os hospitais públicos e privados a manterem medidas de segurança nos departamentos de radiologia e afins. Uma disposição legal que não foi assinada pelo Ministro da Ciência e Tecnologia, o único membro do governo que entende alguma coisa de medicina nuclear. Está agora à espera de ser regulamentada. E em França a situação ainda está pior, acrescentava ele, enquanto terminava a bica. Se um dia destes lerem uma notícia destas a propósito de Portugal, não se admirem.
domingo, dezembro 27
As resoluções de Ano Novo
deviam ser tomadas logo a seguir ao Natal. E postas em prática no primeiro dia útil que esteja a jeito.
quinta-feira, dezembro 24
segunda-feira, dezembro 14
sábado, dezembro 12
quarta-feira, dezembro 9
O argumento de Pascal
Foram propostas muitas provas da existência de Deus. Blaise Pascal propôs uma das mais originais, de natureza probabilistica: Que perdemos se acreditarmos em Deus, e Deus não existir? Nada! Que perdemos se não acreditarmos e ele existir? Tudo! Na dúvida, é mais seguro acreditar em Deus.
Rui Tavares repetiu o argumento de Pascal a propósito da questão das mudanças climáticas. Reconhece que há dúvidas sobre a sua existência, ou sobre o facto de serem provocadas pela industrialização. Que perdemos se os críticos tiverem razão? Nada! Se eles estiverem errados? Tudo! Será mesmo assim? Nem pouco mais ou menos. Rui Tavares comete o erro de confundir as mudanças provocadas pelo clima com o problema global do ambiente. Se quase todos os nosso recursos forem usados para resolver um pseudo problema, como vamos resolver todos os outros problemas do ambiente: chuvas ácidas, poluição das águas, acumulação de lixo e metais pesados nos ocenos, destruição das florestas equatoriais. Precisamos simultaneamente de mais recursos e de restringir o crescimento. Escolher a frente de combate errada é um erro que não nos podemos dar ao luxo de cometer.
Rui Tavares dia também que os cientistas acreditam na realidade do aquecimento global e quem se opõe são os leigos. Está mal informado. Há muita gente a tentar-nos convencer disso. Há mecanismos que contribuem para que muitos cientistas se calem. Há muitas verbas para investigar o aquecimento global. Quem falar publicamente contra fica excluido dessas verbas. Isso vai afectar a carreira do whistleblower e dos seus colaboradores. Os cientistas não são nem mais nem menos corajosos do que as outras pessoas. Não é por acaso que a pessoa que mais tem falado sobre o assunto em Portugal, o Professor Delgado Domingues, é reformado.
Não era sobre estes temas que eu gostava de estar a escrever, acreditem.
Rui Tavares repetiu o argumento de Pascal a propósito da questão das mudanças climáticas. Reconhece que há dúvidas sobre a sua existência, ou sobre o facto de serem provocadas pela industrialização. Que perdemos se os críticos tiverem razão? Nada! Se eles estiverem errados? Tudo! Será mesmo assim? Nem pouco mais ou menos. Rui Tavares comete o erro de confundir as mudanças provocadas pelo clima com o problema global do ambiente. Se quase todos os nosso recursos forem usados para resolver um pseudo problema, como vamos resolver todos os outros problemas do ambiente: chuvas ácidas, poluição das águas, acumulação de lixo e metais pesados nos ocenos, destruição das florestas equatoriais. Precisamos simultaneamente de mais recursos e de restringir o crescimento. Escolher a frente de combate errada é um erro que não nos podemos dar ao luxo de cometer.
Rui Tavares dia também que os cientistas acreditam na realidade do aquecimento global e quem se opõe são os leigos. Está mal informado. Há muita gente a tentar-nos convencer disso. Há mecanismos que contribuem para que muitos cientistas se calem. Há muitas verbas para investigar o aquecimento global. Quem falar publicamente contra fica excluido dessas verbas. Isso vai afectar a carreira do whistleblower e dos seus colaboradores. Os cientistas não são nem mais nem menos corajosos do que as outras pessoas. Não é por acaso que a pessoa que mais tem falado sobre o assunto em Portugal, o Professor Delgado Domingues, é reformado.
Não era sobre estes temas que eu gostava de estar a escrever, acreditem.
Com a verdade me enganas
Temperatura em Portugal aumentou 1,2 graus desde 1930. Que podemos concluir desta frase?
Que nada é mais fácil do que mentir com números.
Sempre que estamos a trabalhar com séries numéricas, só o gráfico traduz alguma verdade.
Ao longo dos ultimos oitentas anos houve anos em que a temperatura média foi superior à do ano passado e outros em que foi inferior. Comparando 1930 com 2009 chegamos a uma conclusão. Comparando outras duas datas bem escolhidas, chegaríamos à conclusão oposta. Quem compara dois números desta forma, é ignorante ou está de má fé.
Este truque é bem velho. Se exceptuarmos momentos de crise grave, os gráficos com a evolução dos valores de um indice da bolsa publicados pelos bancos, pelas correctoras ou pelos livros para imbecis começam sempre na última grande crise. É tão bonito ver como é facil investir na bolsa...
Que nada é mais fácil do que mentir com números.
Sempre que estamos a trabalhar com séries numéricas, só o gráfico traduz alguma verdade.
Ao longo dos ultimos oitentas anos houve anos em que a temperatura média foi superior à do ano passado e outros em que foi inferior. Comparando 1930 com 2009 chegamos a uma conclusão. Comparando outras duas datas bem escolhidas, chegaríamos à conclusão oposta. Quem compara dois números desta forma, é ignorante ou está de má fé.
Este truque é bem velho. Se exceptuarmos momentos de crise grave, os gráficos com a evolução dos valores de um indice da bolsa publicados pelos bancos, pelas correctoras ou pelos livros para imbecis começam sempre na última grande crise. É tão bonito ver como é facil investir na bolsa...
sábado, dezembro 5
quarta-feira, dezembro 2
segunda-feira, novembro 30
domingo, novembro 29
quarta-feira, novembro 25
Belle de Jour
Está na moda as prostitutas de luxo publicarem um blog e escreverem livros sobre as suas experiências. Belle de Jour foi o pseudónimo de uma das primeiras, senão a primeira a ter tal ideia. A autora conseguiu permanecer no anonimato durante anos. Algo especialmente difícil depois de produzir quatro best sellers e ter uma coluna regular num jornal de referência. A semana passada Belle descobriu que alguém ia provavelmente revelar a sua identidade. Resolveu ser ela a dar a cara.
O seu verdadeiro nome é Dr Brooke Magnanti. Tem um doutoramento em Informática e Epidemiologia. Actualmente é investigadora na Bristol Initiative for Research of Child Health. A tese prolongou-se um pouco mais do que a bolsa de doutoramento. Brook procurou um emprego suficientemente bem pago, que lhe deixasse tempo livre para acabar a tese e que não exigisse um grande investimento em formação. Resolveu o problema trabalhando a 400 euros por hora para uma agência de call girls durante catorze meses.
Trata-se de um caso difícil de encaixar no estereótipo da mulher e do chulo. Ela não foi explorada nem coagida, não se pode dizer que não tinha outras opções, divertiu-se, abandonou a prostituição depois de atingir o objectivo, tem uma vida interessante e útil para a sociedade. A experiência não parece ter deixado cicatrizes.
É um caso extremo, mas não é um caso raro. Muitas outras mulheres resolveram facturar aquilo que o mercado lhes oferecia. Apesar de tudo, a maior parte das mulheres continua a culpar os homens. Uma atitude no mínimo algo infantil. É óbvio que não têm razão.
E no entanto...
Talvez haja um chulo dentro da cabeça de cada prostituta. Cada um de nós tem aspectos masculinos e femininos. Funcionamos de uma forma mais harmoniosa se esses elementos coexistirem em equilibrio. Na nossa sociedade o lado masculino é mais pragmático e mais facil de expressar. Em termos contabilisticos, por exemplo. E em frases do tipo Porque não? Responder a essa pergunta a propósito da prostituição é bastante dificil nos tempos que correm.
Os esquimós têm dúzias de palavras para descrever a neve. Nós só temos uma. A neve é bem mais importante para eles do que para nós. Só temos uma palavra para amor. Em sanscrito há várias dúzias de palavras que nós tradiziriamos sempre por amor ou por frases onde aparece a palavra amor. O lado feminino dos homens e das mulheres, o lado que lida com os sentimentos, está em desvantagem na nossa sociedade. Temos muitas palavras para factos objectivos e racionais. Isso permitiu-nos construir uma sociedade mais rica onde nos podemos dar ao luxo de ser mais justos. Por outro lado pagámos o preço desse desenvolvimento em solidão, depressões, vazios. É o que acontece quando negligenciamos os lados mais frageis e subtis das nossas personalidades, onde estão escondidas as riquezas intangiveis de que andamos à procura algures fora de nós.
A Belle vai pagar um preço alto pelas libras que ganhou. Acontece que isso é um problema dela. Temos de acabar com a mania de não deixar os outros (e às vezes a nós mesmos) errar. O homem que as mulheres acusam está dentro de todos os homens e de todas as mulheres. É infantil projectá-lo no primeiro homem que se ponha a jeito, ou nos homens. Mas todos nós executamos esse tipo de projecções a toda a hora.
O seu verdadeiro nome é Dr Brooke Magnanti. Tem um doutoramento em Informática e Epidemiologia. Actualmente é investigadora na Bristol Initiative for Research of Child Health. A tese prolongou-se um pouco mais do que a bolsa de doutoramento. Brook procurou um emprego suficientemente bem pago, que lhe deixasse tempo livre para acabar a tese e que não exigisse um grande investimento em formação. Resolveu o problema trabalhando a 400 euros por hora para uma agência de call girls durante catorze meses.
Trata-se de um caso difícil de encaixar no estereótipo da mulher e do chulo. Ela não foi explorada nem coagida, não se pode dizer que não tinha outras opções, divertiu-se, abandonou a prostituição depois de atingir o objectivo, tem uma vida interessante e útil para a sociedade. A experiência não parece ter deixado cicatrizes.
É um caso extremo, mas não é um caso raro. Muitas outras mulheres resolveram facturar aquilo que o mercado lhes oferecia. Apesar de tudo, a maior parte das mulheres continua a culpar os homens. Uma atitude no mínimo algo infantil. É óbvio que não têm razão.
E no entanto...
Talvez haja um chulo dentro da cabeça de cada prostituta. Cada um de nós tem aspectos masculinos e femininos. Funcionamos de uma forma mais harmoniosa se esses elementos coexistirem em equilibrio. Na nossa sociedade o lado masculino é mais pragmático e mais facil de expressar. Em termos contabilisticos, por exemplo. E em frases do tipo Porque não? Responder a essa pergunta a propósito da prostituição é bastante dificil nos tempos que correm.
Os esquimós têm dúzias de palavras para descrever a neve. Nós só temos uma. A neve é bem mais importante para eles do que para nós. Só temos uma palavra para amor. Em sanscrito há várias dúzias de palavras que nós tradiziriamos sempre por amor ou por frases onde aparece a palavra amor. O lado feminino dos homens e das mulheres, o lado que lida com os sentimentos, está em desvantagem na nossa sociedade. Temos muitas palavras para factos objectivos e racionais. Isso permitiu-nos construir uma sociedade mais rica onde nos podemos dar ao luxo de ser mais justos. Por outro lado pagámos o preço desse desenvolvimento em solidão, depressões, vazios. É o que acontece quando negligenciamos os lados mais frageis e subtis das nossas personalidades, onde estão escondidas as riquezas intangiveis de que andamos à procura algures fora de nós.
A Belle vai pagar um preço alto pelas libras que ganhou. Acontece que isso é um problema dela. Temos de acabar com a mania de não deixar os outros (e às vezes a nós mesmos) errar. O homem que as mulheres acusam está dentro de todos os homens e de todas as mulheres. É infantil projectá-lo no primeiro homem que se ponha a jeito, ou nos homens. Mas todos nós executamos esse tipo de projecções a toda a hora.
domingo, novembro 22
A Treta Global
From: Tom Wigley, Date: Sun, 27 Sep 2009 23:25:38 -0600
So, if we could reduce the ocean blip by, say, 0.15 degC, then this would be significant for the global mean – but we’d still have to explain the land blip. I’ve chosen 0.15 here deliberately. This still leaves an ocean blip, and i think one needs to have some form of ocean blip to explain the land blip (via either some common forcing, or ocean forcing land, or vice versa, or all of these).
Este é um dos e-mails que um hacker, ou um whistle-blower, alegadamente retirou de um computador da University of East Anglia’s Climate Research Unit. Este senhor estava a ajustar os parametros para nos convencer que realmente existe o tal aquecimento global. Estamos a falar do maior escandalo da ciencia. Vão ao google news, escrevam global warming scandal ou outra coisa semelhante, e vejam o que aparece. Ou leiam este artigo do Telegraph e passem pelo Falta de Tempo, onde eu ouvi falar nisto pela primeira vez.
Comunicado dos CRU.
So, if we could reduce the ocean blip by, say, 0.15 degC, then this would be significant for the global mean – but we’d still have to explain the land blip. I’ve chosen 0.15 here deliberately. This still leaves an ocean blip, and i think one needs to have some form of ocean blip to explain the land blip (via either some common forcing, or ocean forcing land, or vice versa, or all of these).
Este é um dos e-mails que um hacker, ou um whistle-blower, alegadamente retirou de um computador da University of East Anglia’s Climate Research Unit. Este senhor estava a ajustar os parametros para nos convencer que realmente existe o tal aquecimento global. Estamos a falar do maior escandalo da ciencia. Vão ao google news, escrevam global warming scandal ou outra coisa semelhante, e vejam o que aparece. Ou leiam este artigo do Telegraph e passem pelo Falta de Tempo, onde eu ouvi falar nisto pela primeira vez.
Comunicado dos CRU.
quarta-feira, novembro 18
Contra os cemitérios
Andam por aí uns desavergonhados que querem destruir a civilização ocidental. Onde é que já se viu pegar num terreno baldio, colocar uns muros à volta e começar a enterrar lá os filhos da terra? Não sabem esses velhacos que ainda há meia dúzia de anos andavam por Dover a embebedar-se pelas tabernas o que é o solo sagrado? Doenças? Enterrar os nossos pais e avós na santa igreja onde vamos orar todos os domingos provoca doenças? Só servos de Belzebu podiam inventar tamanho disparate! Sempre assim se fez e sempre assim se fará! Se eu não lutar para enterrar os meus antepassados perto de Deus, quem irá lutar por mim?
Esta oposição ao Novo está bem ridicularizada n'As Pupilas do Sr. Reitor, um dos poucos livros que uma menina de boas familias podia ler nos anos sessenta, tempos em que o caracter subversivo de muitas obras de Eça ainda permanecia intacto. A luta do liberalismo pela saude pública vem-me sempre à cabeça quando se discute o casamento dos homossexuais, algo à partida bem menos controverso do que por exemplo a questão do aborto. Trata-se tão só do horror ao Novo. É por isso que poucos são aqueles que se são capazes de assumir contra, escondendo-se atrás do pedido do referendo. Se este é um assunto tão secundário como eles dizem, vale a pena gastar o nosso tempo e o nosso dinheiro na realização do tal referendo?
Bem melhor seria este mundo sem estes empata fodas? Talvez não. Afinal, como é que se constroi um braço robotico de alta precisão? Para fazer um buraco para um parafuso com precisão micromilimétrica, temos de criar uma tensão: uma força que empurra para a direita e outra para a esquerda, uma para cima, outra para baixo, uma para a frente, outra para trás. Só esta oposição de forças, de musculos agonistas e antagonistas, permite a um atirador acertar na mouche. Aquilo que parece ser apenas um desperdício de energia, é muito mais do que isso. Sem a Doutora Ferreira Leite, eu e os da minha laia acabavamos por escavacar isto tudo.
Dito isto, se não se lutar com toda a energia contra os imbecis que por aí andam, expondo-os ao ridiculo antes e depois da passagem da lei, não vamos a lado nenhum.
Mas sempre com muita compaixão.
Bem melhor seria este mundo sem estes empata fodas? Talvez não. Afinal, como é que se constroi um braço robotico de alta precisão? Para fazer um buraco para um parafuso com precisão micromilimétrica, temos de criar uma tensão: uma força que empurra para a direita e outra para a esquerda, uma para cima, outra para baixo, uma para a frente, outra para trás. Só esta oposição de forças, de musculos agonistas e antagonistas, permite a um atirador acertar na mouche. Aquilo que parece ser apenas um desperdício de energia, é muito mais do que isso. Sem a Doutora Ferreira Leite, eu e os da minha laia acabavamos por escavacar isto tudo.
Dito isto, se não se lutar com toda a energia contra os imbecis que por aí andam, expondo-os ao ridiculo antes e depois da passagem da lei, não vamos a lado nenhum.
Mas sempre com muita compaixão.
quinta-feira, novembro 12
quarta-feira, novembro 4
Só ofende quem pode?
Sempre achei que sim. Que uma atitude nossa só desiquilibra emocionalmente alguém, voluntaria ou involuntariamente, se essa pessoa se sente ligada a nós por sentimentos de amor, amizade ou admiração, se nós lhe provocamos alguma insegurança, se ela tem algumas expectativas em relação a nós ou projecta em nós o melhor que existe nela.
Algumas pessoas ofendem-se muito facilmente porque são bastante inseguras, ou têm muitos problemas por resolver à flor da pele. As pessoas ofendem-se porque não são capazes de distinguir o pessoal do objectivo. Muito poucas pessoas são capazes de reagir racionalmente numa situação que envolva algum stress.
Sempre tive um certo orgulho dessa capacidade de não me deixar ofender por dá cá aquela palha. Quantas vezes alguém tentou ofender-me, desestabilizar-me ou impressionar-me, ficando meio para o estupefacto quando não o conseguiu.
Entretanto um destes dias ofendi-me mesmo. Continuo indignado. Uma sensação estranha. Uma sensação nova. Não sabe a fraqueza. Se calhar não me ofendi algumas vezes porque me faltava qualquer coisa. Quem não se ofende não é filho de boa gente. Talvez haja alguma verdade nisso. Não sei se mudar é bom ou não. Mas é interessante.
Algumas pessoas ofendem-se muito facilmente porque são bastante inseguras, ou têm muitos problemas por resolver à flor da pele. As pessoas ofendem-se porque não são capazes de distinguir o pessoal do objectivo. Muito poucas pessoas são capazes de reagir racionalmente numa situação que envolva algum stress.
Sempre tive um certo orgulho dessa capacidade de não me deixar ofender por dá cá aquela palha. Quantas vezes alguém tentou ofender-me, desestabilizar-me ou impressionar-me, ficando meio para o estupefacto quando não o conseguiu.
Entretanto um destes dias ofendi-me mesmo. Continuo indignado. Uma sensação estranha. Uma sensação nova. Não sabe a fraqueza. Se calhar não me ofendi algumas vezes porque me faltava qualquer coisa. Quem não se ofende não é filho de boa gente. Talvez haja alguma verdade nisso. Não sei se mudar é bom ou não. Mas é interessante.
Claude Levy-Strauss 1908-2009
Tristes Trópicos, a autobiografia de Claude Levy Strauss, é uma das maiores obras primas da Literatura do século XX. As suas descrições das suas viagens pelo Novo Mundo são inesqueciveis. Metade do livro é dedicado ao Brasil. Começa em Salvador da Bahia, e vai-se internando pela selva até chegar aos pontos mais inesplorados da selva amazónica. Fala-nos sobretudo das pessoas e mostra-nos que elas não são diferentes de nós. Não devido aos imperativos do politicamente correcto, mas por razões bem claras.
Os "primitivos" não são estúpidos. A haver estúpidos, somos nós.
Um habitante do Amazonas conhece a fauna e a flora da região tão bem como qualquer equipa de biologos composta por um botanico, um entomologista e um zoologo que tenham queimado as pestanas a fazer o seu PhD e depois tenham passado uns anos a complementar os seus conhecimentos in loco. Quando se desloca a uma região nova por qualquer razão, o primitivo recolhe exemplares da flora da região que não conhece e leva-as para tentar perceber para que servem, realizando todo o tipo de experiencias. Se possivel, conferencia com os habitantes da região, procurando obter informações sobre as plantas que descobriu e sobre outras que lhe tenham escapado.
A nossa sobrevivencia está assegurada e nós não precisamos de puxar pela cabeça para sobreviver. O cérebro dos animais domésticos é mais pequeno do que o dos seus equivalentes selvagens pela mesma razão: falta de uso.
Os "primitivos" não são estúpidos. A haver estúpidos, somos nós.
Um habitante do Amazonas conhece a fauna e a flora da região tão bem como qualquer equipa de biologos composta por um botanico, um entomologista e um zoologo que tenham queimado as pestanas a fazer o seu PhD e depois tenham passado uns anos a complementar os seus conhecimentos in loco. Quando se desloca a uma região nova por qualquer razão, o primitivo recolhe exemplares da flora da região que não conhece e leva-as para tentar perceber para que servem, realizando todo o tipo de experiencias. Se possivel, conferencia com os habitantes da região, procurando obter informações sobre as plantas que descobriu e sobre outras que lhe tenham escapado.
A nossa sobrevivencia está assegurada e nós não precisamos de puxar pela cabeça para sobreviver. O cérebro dos animais domésticos é mais pequeno do que o dos seus equivalentes selvagens pela mesma razão: falta de uso.
quinta-feira, outubro 29
Demasiadas perguntas
Cada pergunta tem quatro respostas possíveis:
DD - discordo totalmente.
D - não concordo
C - concordo parcialmente.
CC - concordo totalmente.
O melhor é arranjarem um papel ou um ficheiro word e anotar as respostas juntamente com os asteriscos.
O resto das instruções estão no primeiro comentário.
Agora clikem aqui e leiam os dois comentários.
Se publicar os resultados pode comprometer a acuidade das respostas, mais vale não publicar!
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CC - concordo totalmente.
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I
- A minha vida satisfaz-me.
- Sinto-me à vontade quando encontro novas pessoas.
- Situações novas causam-me stress.*
- O meu trabalho não usa as minhas capacidades.*
- Tenho uma atitude positica para com o dinheiro.
- Não uso o meu tempo de forma eficiente.*
- Sou uma pessoa cheia de energia.
- Em geral encaro uma responsabilidade como sendo um fardo.*
- Não me sobra tempo para relaxar e divertir.*
- Normalmente atinjo os objectivos a que me proponho.
II
- Gosto de mim enquanto uma pessoa.
- Tenho (tinha) uma relação terna com os meus pais.
- Passo frequentemente por situações emocionais difíceis (tristeza/ansiedade/raiva/stress).*
- Sinto-me desconfortavel quando estou só.*
- Consigo manter um equilíbrio entre o tempo que dedico a mim próprio e o que dedico aos outros.
- Tenho dificuldades em concentrar-me e em pensar com clareza.*
- É-me facil demonstrar aos outros amor e afecto.
- Não estou satisfeito com as minhas relações pessoais.*
- Nunca sei exactamente o que estou a sentir.*
- Tenho uma boa relação com o meu corpo.
III
- Acho que sei o que é o melhor para mim.
- Sou capaz de exprimir a minha criatividade de várias maneiras diferentes.
- Não estou interessado no que se passa no meu inconsciente.*
- Não acredito em intuições ou em guias interiores.*
- Tenho uma visão positiva do meu futuro.
- Raramente dou atenção aos meus sonhos.*
- Acho que estou a crescer espiriritualmente e a desenvolver-me.
- Não me parece que o meu espírito possa ter um papel activo na recuperação dos meus problemas físicos ou psicologicos.*
- Tenho dificuldade de imaginar o que nunca experimentei.*
- Sinto frequentemente uma ligação à natureza.
IV
- Sinto a presença de algo mais poderoso do que eu (Deus/Dharma/Tao...).
- Cultivo o amor e a compaixão por tudo o que me rodeia.
- Nenhuma forma espiritualidade faz sentido para mim.*
- Não me parece que a minha existência tenha algum grande propósito.*
- É importante para mim que a minha vida tenha um impacto no Mundo.
- Não pratico qualquer forma de prática espiritual (meditação/contemplação/oração).*
- Realizo regularmente actividades que me ajudam a recuperar o equilíbrio emocional.
- Sou facilmente apanhado a realizar actividades superficiais ou a com preocupações do mesmo tipo.*
- Raramente me confronto com o significado das minhas experiencias de vida.*
- Quando tomo decisões sigo aquilo que me parece correcto de um ponto de vista espiritual.
Agora clikem aqui e leiam os dois comentários.
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quarta-feira, outubro 28
O eixo do Mal
The American Academy of Family Physicians has announced a corporate sponsorship with Coca-Cola and is also accepting an undisclosed amount of money from them as well.
A AAFP assinou um acordo com a Coca Cola no sentido de lançar uma campanha para educar as crianças no uso adequado de bebidas não alcoolicas e adoçantes artificiais.
A AAFP assinou um acordo com a Coca Cola no sentido de lançar uma campanha para educar as crianças no uso adequado de bebidas não alcoolicas e adoçantes artificiais.
Não havia provas
Mas os indicios eram suficientes para compreender o que se passava. Agora temos a certeza.
quarta-feira, outubro 21
Algumas perguntas banais sobre o aquecimento global
Uns dizem que há, outros que não é bem assim. Quem tem razão? Como podemos saber quem tem razão? Podemos saber quem tem razão? Há por aí toda uma série de pessoas e empresas que promovem a ideia da existência do aquecimento global, porque têm bastante a lucrar com isso, ou porque usam essa ameaça como arma política para tentar converter as pessoas a um outro modo de vida. Podemos concluir daí que se trata de uma farsa? E se não for e o ignorarmos?
sexta-feira, outubro 16
O Astrologo e o Cientista
As manhãs e as tardes dos nossos canais generalistas estão desde há alguns anos ocupadas com programas de entretenimento para donas de casa que tentam imitar Oprah Winfrey, com um orçamento bem mais reduzido. Uma das lutas de galos baratinhas que eles gostam de organizar é colocar de um lado um ateu ou um cientista e do outro uma cartomante, um astrologo ou uma vidente. A variante astrologo versus cientista é a que corre pior para o representate da Razão. A posteriori, o cientista arranja boas explicações para o facto de a discussão não lhe ter corrido tão bem como ele esperava. A televisão é um meio de comunicação que não se presta muito bem à transmissão de mensagens complexas. As mais simplistas passam com mais facilidade e o astrologo está à partida em vantagem. Mas porque é que ele não pensou nisso antes de aceitar o convite?
O caso do astrologo é especialmente emblemático. A força gravítica dos planetas é demasiado fraca para ter qualquer efeito sobre as pessoas. Mesmo que assim não fosse, a precessão dos equinócios desactualizou todos os cálculos. O astrologo faz uma figura ridícula aos olhos do cientista.
Acontece que os cientistas são operários especializados, artesões que sabem produzir sapatos de alta qualidade. Normalmente não lhes sobra tempo para pensar em muito mais. Sobretudo não lhes sobra muito tempo para pensar em como funcionam as pessoas. É claro que estas palavras também se aplicam a mim.
Um bom astrologo passa a vida a pensar em como funcionam as pessoas. Os horoscopos são apenas um pretexto, um ponto de partida para começar uma consulta. O que se passa depois não sei. Não me atrevo a emitir opiniões sobre o que desconheço. Se a crença no determinismo dos astros pode agir como um placebo em favor dos objectivos do astrologo, que mal há nisso? Claro que o astrologo nunca o pode admitir. E alguns até acreditarão nos astros. Os advogados também acabam por acreditar nos clientes que defendem, mesmo quando há todas as razões para pensar o oposto.
Para muitos astrologos, o idiota é o cientista que supõe que o seu trabalho consiste em analisar cartas astrologicas. O idiota é o cientista que só conhece a dimensão racional de uma pessoa, ignorando tudo o resto. O astrologo age sobre o inconsciente das pessoas, algo em geral muito mais poderoso do que apelar à sua racionalidade. Numa disputa realizada fora das paredes de uma universidade o cientista dificilmente terá alguma hipótese. Nem alguma vez perceberá o que lhe aconteceu.
O caso do astrologo é especialmente emblemático. A força gravítica dos planetas é demasiado fraca para ter qualquer efeito sobre as pessoas. Mesmo que assim não fosse, a precessão dos equinócios desactualizou todos os cálculos. O astrologo faz uma figura ridícula aos olhos do cientista.
Acontece que os cientistas são operários especializados, artesões que sabem produzir sapatos de alta qualidade. Normalmente não lhes sobra tempo para pensar em muito mais. Sobretudo não lhes sobra muito tempo para pensar em como funcionam as pessoas. É claro que estas palavras também se aplicam a mim.
Um bom astrologo passa a vida a pensar em como funcionam as pessoas. Os horoscopos são apenas um pretexto, um ponto de partida para começar uma consulta. O que se passa depois não sei. Não me atrevo a emitir opiniões sobre o que desconheço. Se a crença no determinismo dos astros pode agir como um placebo em favor dos objectivos do astrologo, que mal há nisso? Claro que o astrologo nunca o pode admitir. E alguns até acreditarão nos astros. Os advogados também acabam por acreditar nos clientes que defendem, mesmo quando há todas as razões para pensar o oposto.
Para muitos astrologos, o idiota é o cientista que supõe que o seu trabalho consiste em analisar cartas astrologicas. O idiota é o cientista que só conhece a dimensão racional de uma pessoa, ignorando tudo o resto. O astrologo age sobre o inconsciente das pessoas, algo em geral muito mais poderoso do que apelar à sua racionalidade. Numa disputa realizada fora das paredes de uma universidade o cientista dificilmente terá alguma hipótese. Nem alguma vez perceberá o que lhe aconteceu.
sábado, outubro 10
O Símbolo Perdido
É o novo livro de Dan Brown, o tipo do Código da Vinci. O techno-triller, criado por Michael Crichton e Tom Clancy, é um novo genre da literatura de suspense, caracterizada pelo extraordinário detalhe das discrições da tecnologia envolvida, o que de alguma forma compensa a menor riqueza com que são descritas as personagens e a relativa simplicidade do enredo. Os três últimos livros de Dan Brown contam a mesma história, personagens semelhantes representam os mesmos papeis, só variam os detalhes. Mas são esses detalhes que verdadeiramente interessam.
Brown começou por seguir as pegadas de Crichton. Em Anjos e Demónios criou um novo sub-genre. A tecnologia que invadiu as nossas vidas desde há um século é combinada com um conhecimento detalhado da forma como se expressaram ao longo dos tempos todos os medos e esperanças que povoam o nosso inconsciente desde há milénios. And thats when the big bucks started rolling in. Dois outros ingredientes contribuiram para o sucesso de vendas:
Toda a história se desenrola a um ritmo alucinante, normalmente em 24 horas. Esta ideia já foi tão copiada (ver a série 24, por exemplo) que agora Dan Brown reduziu para 12.
O ataque a uma instituição: o Vaticano em Anjos e Demónios, a Opus Day no codigo. Este último ingrediente perdeu-se. Os católicos não mordem por aí além. Não há por aí muitas outras instituições que de alguma forma ainda dêem a outra face. Dizia-se que este livro saíria pouco antes das eleições americanas do ano passado, referindo o papel da Skull and Bonnes nas eleições americanas. Brown percebeu que não era boa ideia atacar a família Bush e os falcões do partido republicano. Foi aí que perdeu a hipótese de repetir o impacto do Código.
Dito isto, o livro está cheio de pequenas pérolas, como a referência à ignorada ascensão aos céus de George Washington, pintada no tecto do Capitólio e a análise da gravura de Dürer reproduzida acima.
Brown começou por seguir as pegadas de Crichton. Em Anjos e Demónios criou um novo sub-genre. A tecnologia que invadiu as nossas vidas desde há um século é combinada com um conhecimento detalhado da forma como se expressaram ao longo dos tempos todos os medos e esperanças que povoam o nosso inconsciente desde há milénios. And thats when the big bucks started rolling in. Dois outros ingredientes contribuiram para o sucesso de vendas:
Toda a história se desenrola a um ritmo alucinante, normalmente em 24 horas. Esta ideia já foi tão copiada (ver a série 24, por exemplo) que agora Dan Brown reduziu para 12.
O ataque a uma instituição: o Vaticano em Anjos e Demónios, a Opus Day no codigo. Este último ingrediente perdeu-se. Os católicos não mordem por aí além. Não há por aí muitas outras instituições que de alguma forma ainda dêem a outra face. Dizia-se que este livro saíria pouco antes das eleições americanas do ano passado, referindo o papel da Skull and Bonnes nas eleições americanas. Brown percebeu que não era boa ideia atacar a família Bush e os falcões do partido republicano. Foi aí que perdeu a hipótese de repetir o impacto do Código.
Dito isto, o livro está cheio de pequenas pérolas, como a referência à ignorada ascensão aos céus de George Washington, pintada no tecto do Capitólio e a análise da gravura de Dürer reproduzida acima.
quarta-feira, outubro 7
Benfica Stars Fund: A aritmética segundo Luís Filipe Vieira
A SAD benfiquista anunciou esta terça-feira que subscreveu 15 por cento do valor total do "Benfica Stars Fund - Fundo Especial de Investimento Mobiliário Fechado", num investimento global de 6 milhões de euros.
Se a SAD investe, deve ser seguro...
Deixem lá ver se eu percebo este comunicado. Quem comprar unidades de participação do Benfica Stars Fund, compra direitos sobre futuras vendas dos passes de certos jogadores do Benfica. A quem pertencem actualmente esses passes? À SAD. O que significa subscrever 15% do fundo? Significa que a SAD comprou a si própria unidades de subscrição do fundo. Significa também que a SAD vendeu só 85% do valor nominal desses passe, qualquer coisa como 34 milhões de euros. Comprar 6 milhões de euros ou vender 34 não é exactamente a mesma coisa.
Se a SAD investe, deve ser seguro...
Deixem lá ver se eu percebo este comunicado. Quem comprar unidades de participação do Benfica Stars Fund, compra direitos sobre futuras vendas dos passes de certos jogadores do Benfica. A quem pertencem actualmente esses passes? À SAD. O que significa subscrever 15% do fundo? Significa que a SAD comprou a si própria unidades de subscrição do fundo. Significa também que a SAD vendeu só 85% do valor nominal desses passe, qualquer coisa como 34 milhões de euros. Comprar 6 milhões de euros ou vender 34 não é exactamente a mesma coisa.
terça-feira, outubro 6
"Termos tecnicos": Violação e Recessão
O que é uma recessão? É um período durante a qual a economia se contrai. As vendas diminuem, os inventários começam a crescer, depois a produção diminui para se ajustar à procura e as ofertas de empregos começam por diminuir. Se a contracção continua, alguns trabalhadores vão parar ao desemprego.
Toda a contracção é uma recessão? Não. Existem efeitos sazonais. Em certos trimestres há mais actividade económica do que outros. Durante o verão o turismo estimula a actividade económica, em Dezembro temos o Natal. Para além do mais nessas alturas uma boa parte da população recebe um mês suplementar de salário e gasta boa parte dele.
Como se deveria então definir recessão? Um definição razoavel seria: estamos em recessão se durante dois trimestres consecutivos a actividade economica for inferior à actividade economica do mesmo semestre do ano anterior. É esse o fenomeno que mexe com os nossos bolsos e os nossos empregos.
Quando é que estamos em recessão tecnica? Quando a produção diminui em dois trimestres consecutivos. Só num período de crise extrema se produz menos no trimestre do Verão do que no trimestre da Primavera. O que permite a muitos primeiros ministros anunciar no fim de cada verão o fim da recessão tecnica. Já viram este filme?
Por outro lado, cada vez que caímos em recessão tecnica devemos estar descansados. Afinal não é uma recessão a sério, é só uma recessao tecnica. Uma technicality. Mas afinal, o que é uma recessão sem o qualificativo tecnico? Não está definido...
Se não temos palavra para o definir algo, é quase como se esse algo não existisse.
Polanski violou uma jovem de treze anos? O que quer dizer violou?
A palavra violação costuma ser usada quando existe sexo não consensual. Não foi o caso. A jovem em causa sempre o afirmou e continua a afirmar.
Não estou a dizer que Polanski não tenha cometido um crime e não deva ser punido. Só estou a referir que a palavra violação está a ser usada no seu sentido tecnico. Quem detem o poder também detem o poder de manipular a linguagem. E a palavra violação faz toda a diferença.
O caso Polanski é sobretudo um problema legal e não um problema moral ou um problema de direitos humanos. Qualquer um de nós arranjaria problemas legais gravíssimos se se comportasse na Arábia Saudita da forma como se comporta aqui. Pela minha parte tenho muitas duvidas sobre varias decisões ou não decisões dos tribunais portugueses. A justiça americana também não é exemplar em termos de direitos humanos. Pense cada um de nós o que quiser sobre o enquadramento legal do caso Polanski. Por mim, preferia deixar de fora os direitos humanos e a moral. Se vamos por aí, se há alguém a querer e poder invocar os direitos humanos neste caso, esse alguém até é o Polanski. A suposta violada já disse de sua justiça.
Depois de me chamarem a atenção sobre a história do crime cometido por Polansky, fiz uma busca pela internet. Trata-se efectivamente de uma violação. Espero que se faça justiça. Estamos sempre a aprender...
Toda a contracção é uma recessão? Não. Existem efeitos sazonais. Em certos trimestres há mais actividade económica do que outros. Durante o verão o turismo estimula a actividade económica, em Dezembro temos o Natal. Para além do mais nessas alturas uma boa parte da população recebe um mês suplementar de salário e gasta boa parte dele.
Como se deveria então definir recessão? Um definição razoavel seria: estamos em recessão se durante dois trimestres consecutivos a actividade economica for inferior à actividade economica do mesmo semestre do ano anterior. É esse o fenomeno que mexe com os nossos bolsos e os nossos empregos.
Quando é que estamos em recessão tecnica? Quando a produção diminui em dois trimestres consecutivos. Só num período de crise extrema se produz menos no trimestre do Verão do que no trimestre da Primavera. O que permite a muitos primeiros ministros anunciar no fim de cada verão o fim da recessão tecnica. Já viram este filme?
Por outro lado, cada vez que caímos em recessão tecnica devemos estar descansados. Afinal não é uma recessão a sério, é só uma recessao tecnica. Uma technicality. Mas afinal, o que é uma recessão sem o qualificativo tecnico? Não está definido...
Se não temos palavra para o definir algo, é quase como se esse algo não existisse.
Polanski violou uma jovem de treze anos? O que quer dizer violou?
A palavra violação costuma ser usada quando existe sexo não consensual. Não foi o caso. A jovem em causa sempre o afirmou e continua a afirmar.
Não estou a dizer que Polanski não tenha cometido um crime e não deva ser punido. Só estou a referir que a palavra violação está a ser usada no seu sentido tecnico. Quem detem o poder também detem o poder de manipular a linguagem. E a palavra violação faz toda a diferença.
O caso Polanski é sobretudo um problema legal e não um problema moral ou um problema de direitos humanos. Qualquer um de nós arranjaria problemas legais gravíssimos se se comportasse na Arábia Saudita da forma como se comporta aqui. Pela minha parte tenho muitas duvidas sobre varias decisões ou não decisões dos tribunais portugueses. A justiça americana também não é exemplar em termos de direitos humanos. Pense cada um de nós o que quiser sobre o enquadramento legal do caso Polanski. Por mim, preferia deixar de fora os direitos humanos e a moral. Se vamos por aí, se há alguém a querer e poder invocar os direitos humanos neste caso, esse alguém até é o Polanski. A suposta violada já disse de sua justiça.
Depois de me chamarem a atenção sobre a história do crime cometido por Polansky, fiz uma busca pela internet. Trata-se efectivamente de uma violação. Espero que se faça justiça. Estamos sempre a aprender...
segunda-feira, outubro 5
A sobremesa
Durante dois anos Sócrates passou por ser um governante decidido e equilibrado. Depois começaram as gafes. Que aconteceu? A mudança pode ter tido alguma coisa a ver a saida de António Costa para a camara de Lisboa. Alguém que quase me merece o benefício da dúvida. Ele e Rui Rio são os únicos nomes com possibilidade de chegar a primeiro ministro a quem eu reconheço alguma capacidade para o cargo. Em Lisboa temos ainda a possibilidade de manter Santana Lopes a andar por aí. Já percebi que não podemos esperar mais do que isso, quando lidamos com ervas daninhas.
Felizmente não voto no concelho com mais licenciados do país. Tinha de decidir se votava ou não no sr. Isaltino.
Onde eu gostava mesmo de votar era em Almada. Contribuir para a não eleição de Paulo Pedroso, esse sim é um verdadeiro dever civico.
Felizmente não voto no concelho com mais licenciados do país. Tinha de decidir se votava ou não no sr. Isaltino.
Onde eu gostava mesmo de votar era em Almada. Contribuir para a não eleição de Paulo Pedroso, esse sim é um verdadeiro dever civico.
sexta-feira, outubro 2
Greg House 3
Nel mezzo del cammin di nostra vita
mi ritrovai per una selva oscura
ché la diritta via era smarrita.
Da nossa vida, em meio da jornada,
Achei-me numa selva tenebrosa,
Tendo perdido a verdadeira estrada.
Assim começa a Divina Comédia. Dante confessa-nos que ao atingir a meia idade se sentiu perdido. A vida deixou de fazer sentido. As lembranças das causas porque lutou, daquilo que construiu, só lhe deixam um travo amargo na boca. A vida não passa de um desespero tranquilo. O poema é simultaneamente a história da sua auto-cura, contada de forma alegórica, e o remédio que o curou.
Dante começa por encontrar Virgílio, o autor da Eneida, o poema épico que ele espera emular ao escrever a Divina Comédia. Virgílio conduz Dante através do Inferno, levando-o até ao Purgatório. Virgilio representa a razão, o lado intelectual de Dante, o grande responsável pela situação actual de Dante mas também a única força que o mantem inteiro. Visitar o Inferno é ganhar consciencia total da sua situação. Dante está a viver o Inferno na Terra. É esse o primeiro passo da sua viagem interior.
Virgílio conduz Dante até às portas do Purgatório, onde Beatriz o espera. Dante apaixonou-se por Beatrice Portinari aos nove anos, tinha ela oito. Viu-a meia dúzia de vezes durante toda a sua vida. Beatriz casou aos vinte e um e morreu de peste aos vinte e quatro. Dante dedicou-lhe todos os seus poemas mais importantes e nunca a esqueceu. É através do seu lado feminino que um homem se relaciona com o seu inconsciente e produz trabalho criativo. Por isso se fala da musa inspiradora. Muitas vezes esse lado feminino ganha uma representação mais concreta. A musa ganha um rosto.
Beatriz conduz Dante através do Purgatório, ajudando-o a reencontrar o seu caminho. É aí que começa a Purga. Finalmente atingem o Céu, o extase momentaneo associado ao alivio de recuperar o sentido da vida.
House é a história da mid life crisis de Greg House, MD. Greg já completou a sua travessia do inferno e encontra agora a sua Beatriz, personificada em Amber, a ex-namorada do seu amigo James Wilson, morta num acidente. Cada um tem a musa que merece e Amber é bem diferente da doce Beatriz. Cada tipo de obra de arte tem as suas convenções. Nós vemos Amber em carne e osso, uma imagem bem definida. Não podia ser de outra forma. Não significa isso que seria assim que o House a sentia. Seria mais razoavel que o lado feminino de House se manifestasse através de uma voz interior e de uma sensação de presença indefinida.
House lida mal com o aparecimento do seu lado feminino. Pergunta-se se estará louco. O aparecimento de Amber é o ingrediente fundamental do gran finale da quinta série. Estou mais ou menos seguro que a sexta série vai começar com House de volta ao hospital, uns meses mais tarde. Vai ser curioso ver como a série evolui. Num one hour drama algo muda para que tudo fique na mesma. Mesmo na Divina Comédia, o Inferno é bem mais interessante do que o paraíso. Os autores não se podem dar ao luxo de deixar que House ultrapasse a crise da meia idade.
Convem no entanto salientar que o aparecimento de Amber faz bem mais sentido do que muitas outras leviandades que encontramos nos one hour dramas. É por isso que House é diferente.
House 1
House 2
mi ritrovai per una selva oscura
ché la diritta via era smarrita.
Da nossa vida, em meio da jornada,
Achei-me numa selva tenebrosa,
Tendo perdido a verdadeira estrada.
Assim começa a Divina Comédia. Dante confessa-nos que ao atingir a meia idade se sentiu perdido. A vida deixou de fazer sentido. As lembranças das causas porque lutou, daquilo que construiu, só lhe deixam um travo amargo na boca. A vida não passa de um desespero tranquilo. O poema é simultaneamente a história da sua auto-cura, contada de forma alegórica, e o remédio que o curou.
Dante começa por encontrar Virgílio, o autor da Eneida, o poema épico que ele espera emular ao escrever a Divina Comédia. Virgílio conduz Dante através do Inferno, levando-o até ao Purgatório. Virgilio representa a razão, o lado intelectual de Dante, o grande responsável pela situação actual de Dante mas também a única força que o mantem inteiro. Visitar o Inferno é ganhar consciencia total da sua situação. Dante está a viver o Inferno na Terra. É esse o primeiro passo da sua viagem interior.
Virgílio conduz Dante até às portas do Purgatório, onde Beatriz o espera. Dante apaixonou-se por Beatrice Portinari aos nove anos, tinha ela oito. Viu-a meia dúzia de vezes durante toda a sua vida. Beatriz casou aos vinte e um e morreu de peste aos vinte e quatro. Dante dedicou-lhe todos os seus poemas mais importantes e nunca a esqueceu. É através do seu lado feminino que um homem se relaciona com o seu inconsciente e produz trabalho criativo. Por isso se fala da musa inspiradora. Muitas vezes esse lado feminino ganha uma representação mais concreta. A musa ganha um rosto.
Beatriz conduz Dante através do Purgatório, ajudando-o a reencontrar o seu caminho. É aí que começa a Purga. Finalmente atingem o Céu, o extase momentaneo associado ao alivio de recuperar o sentido da vida.
House é a história da mid life crisis de Greg House, MD. Greg já completou a sua travessia do inferno e encontra agora a sua Beatriz, personificada em Amber, a ex-namorada do seu amigo James Wilson, morta num acidente. Cada um tem a musa que merece e Amber é bem diferente da doce Beatriz. Cada tipo de obra de arte tem as suas convenções. Nós vemos Amber em carne e osso, uma imagem bem definida. Não podia ser de outra forma. Não significa isso que seria assim que o House a sentia. Seria mais razoavel que o lado feminino de House se manifestasse através de uma voz interior e de uma sensação de presença indefinida.
House lida mal com o aparecimento do seu lado feminino. Pergunta-se se estará louco. O aparecimento de Amber é o ingrediente fundamental do gran finale da quinta série. Estou mais ou menos seguro que a sexta série vai começar com House de volta ao hospital, uns meses mais tarde. Vai ser curioso ver como a série evolui. Num one hour drama algo muda para que tudo fique na mesma. Mesmo na Divina Comédia, o Inferno é bem mais interessante do que o paraíso. Os autores não se podem dar ao luxo de deixar que House ultrapasse a crise da meia idade.
Convem no entanto salientar que o aparecimento de Amber faz bem mais sentido do que muitas outras leviandades que encontramos nos one hour dramas. É por isso que House é diferente.
House 1
House 2
quinta-feira, outubro 1
quarta-feira, setembro 30
Desta vez deu Cavaco
O homem irrita-me. Sempre me irritou. Para meu grande espanto, dei por mim a pensar antes das últimas presidenciais: espero que o Cavaco ganhe à primeira volta, senão ainda vou ter de votar nele. Lá por isso o homem continuou a irritar-me. Depois veio o estatuto dos Açores. Todos os partidos desceram até à mais rasteira das demagogias. Só Cavaco disse o que tinha de ser dito. Estas eleições o PS ultrapassou todos os limites da manipulação. Deu resultado. As pessoas até se esqueceram de como será dificil a Sócrates governar em minoria. Bastará que o PCP e o Bloco se abstenham para que o voto conjunto do CDS e do PSD derrote o PS. O PS só terá hipoteses de chegar ao fim da legislatura com um presidente da mesma cor. Sócrates sabe-o e provocou Cavaco. Cavaco mordeu o isco. Resta saber se Sócrates tem arcaboiço para pescar em aguas profundas.
Muitos acusaram Sócrates de muitas coisas. Algumas das acusações, embora não decisivas, estão provadas para lá de toda a dúvida. Quando o presidente se junta ao coro, muitos mais deixarão de ignorar que algo está podre no reino da Dinamarca.
Cavaco conquistou a sua primeira maioria absoluta devido ao seu especial talento para irritar Vitor Constancio, lider do PS à altura, levando-o a avançar para uma moção de censura suicida. Seria irónico que quem pela irritação matou pela irritação morra. Se Cavaco perder as eleições retira-se da política com um gosto amargo na boca, mas será apenas um epsilon na sua carreira política. Outros terão muito mais a perder.
Numa disputa entre o presidente e um partido sem maioria absoluta ninguém dúvida quem é que está em desvantagem. Quando essa disputa nos leva a comparar a integridade de dois homens, a quem é que nós compraríamos um carro usado? A intervenção de Cavaco pode ter sido desajeitada. Pela minha parte acho que a indignação de um homem honrado perante a perfídia vigente é altamente refrescante.
De momento estão todos contra Cavaco. Um ano em política é uma eternidade e o tempo joga a favor do presidente. Quem se desgasta todos os dias é o governo. Não sei quantos portugueses se sentiriam descansados com um governo Sócrates não vigiado. Vamos ter um ano bem interessante.
Quando surgiram problemas no final do primeiro mandato, todos os presidentes assobiaram para o lado. Cavaco não o fez. A sua coragem pode até vir a custar-lhe o segundo mandato. Mas terá certamente o meu voto.
Muitos acusaram Sócrates de muitas coisas. Algumas das acusações, embora não decisivas, estão provadas para lá de toda a dúvida. Quando o presidente se junta ao coro, muitos mais deixarão de ignorar que algo está podre no reino da Dinamarca.
Cavaco conquistou a sua primeira maioria absoluta devido ao seu especial talento para irritar Vitor Constancio, lider do PS à altura, levando-o a avançar para uma moção de censura suicida. Seria irónico que quem pela irritação matou pela irritação morra. Se Cavaco perder as eleições retira-se da política com um gosto amargo na boca, mas será apenas um epsilon na sua carreira política. Outros terão muito mais a perder.
Numa disputa entre o presidente e um partido sem maioria absoluta ninguém dúvida quem é que está em desvantagem. Quando essa disputa nos leva a comparar a integridade de dois homens, a quem é que nós compraríamos um carro usado? A intervenção de Cavaco pode ter sido desajeitada. Pela minha parte acho que a indignação de um homem honrado perante a perfídia vigente é altamente refrescante.
De momento estão todos contra Cavaco. Um ano em política é uma eternidade e o tempo joga a favor do presidente. Quem se desgasta todos os dias é o governo. Não sei quantos portugueses se sentiriam descansados com um governo Sócrates não vigiado. Vamos ter um ano bem interessante.
Quando surgiram problemas no final do primeiro mandato, todos os presidentes assobiaram para o lado. Cavaco não o fez. A sua coragem pode até vir a custar-lhe o segundo mandato. Mas terá certamente o meu voto.
terça-feira, setembro 29
domingo, setembro 27
Matemática Ilegal
584201=733 x 797 ? Parece que sim.
Mas cuidado, quando decompuserem um número nos seus factores primos podem estar a cometer uma ilegalidade.
Mas cuidado, quando decompuserem um número nos seus factores primos podem estar a cometer uma ilegalidade.
sábado, setembro 26
Uma das mil razões porque eu não voto PS
Dentro em breve os jovens com dificuldades de aprendizagem vão passar a ser tratados condignamente pelo estado português. Até agora era-lhes negado o direito a estar numa aula com alunos normais, a viver a vida em sociedade. Essa injustiça tem os seus dias contados. Estou a falar de jovens com problemas leves mas também de autistas (e estava a ser ironico, caso não tenham reparado). Por acaso até parece que a maioria dos pais dessas crianças nem estão nada interessados no fim desta discriminação, antes pelo contrário. Esta medida humanitária tem ainda a vantagem de aliviar os cofres do estado. Se os pais não entendem as vantagens inerentes a este novo direito, eles que paguem do bolso deles para ter os seus filhos educados à parte.
O efeito desta medida sobre a qualidade do ensino só não é obvia para aqueles que são bem piores do que os cegos, porque não querem ver. Em tempos a escola pública permitia a um jovem inteligente proveniente de uma família sem grandes recursos económicos ou culturais ter as oportunidades que os seus pais não tiveram. Se hoje já não podemos dizer o mesmo, pior é sempre possível.
Só um país rico pode dar aos seus cidadãos mais desfavorecidos pela biologia a possibilidade de minorarem os handicaps com que nasceram. Os recursos são finitos. Portugal até é um país relativamente rico à escala mundial, mas está a empobrecer. A maior riqueza de um país é a educação dos seus cidadãos. Não é um tema com que se brinque ou com que se façam experiencias caprichosas. No fim são sempre os mais desfavorecidos a pagar a factura.
O efeito desta medida sobre a qualidade do ensino só não é obvia para aqueles que são bem piores do que os cegos, porque não querem ver. Em tempos a escola pública permitia a um jovem inteligente proveniente de uma família sem grandes recursos económicos ou culturais ter as oportunidades que os seus pais não tiveram. Se hoje já não podemos dizer o mesmo, pior é sempre possível.
Só um país rico pode dar aos seus cidadãos mais desfavorecidos pela biologia a possibilidade de minorarem os handicaps com que nasceram. Os recursos são finitos. Portugal até é um país relativamente rico à escala mundial, mas está a empobrecer. A maior riqueza de um país é a educação dos seus cidadãos. Não é um tema com que se brinque ou com que se façam experiencias caprichosas. No fim são sempre os mais desfavorecidos a pagar a factura.
quarta-feira, setembro 23
domingo, setembro 20
Como aprendemos, como comunicamos, como armazenamos informação?
Espreitem isto. Aprendi muito sobre como é que comunicava com as pessoas quando fiz um teste deste género. Qual é o vosso tipo?
sexta-feira, setembro 18
terça-feira, setembro 15
O dever cívico
Suponhamos que era nosso dever cívico votar. Então tínhamos direito a exprimir a nossa opinião. Podíamos votar negro, o voto dos que não se sentem representados. O voto branco? Nada distingue quem vota em branco de quem coloca o cruzinha fora do sítio por displicencia ou imbecilidade. É claro que nenhum político quer que o eleitor possa manifestar-se contra o sistema. Os políticos formam uma casta mais ou menos fechada. A sua alternância e eventual sacrifício de um dos seus membros pouco mais é do que a ilusão que mantem a casta no poder.
À falta de melhor, esqueçamos a treta do dever cívico: o voto é um direito lúdico. Por exemplo: imaginem qual foi o prazer que me deu ver a cara do João Soares quando eu votei no Santana Lopes. O homem bem se queixou dos votos da esquerda que foram indevidamente parar ao Santana. Seria meu dever cívico votar nele? É verdade que eu não podia sonhar quanto é que me custaria a brincadeira. Como também não sei qual seria a conta que o João me apresentaria, mais vale lembrar-me que o consulado do Santana foi o mais divertido de sempre.
Azar, azar é a Manuela não ter graça nenhuma. Mas a cara do Pedro quinze dias depois, sempre pode equilibrar as coisas. Votar é um assunto sério? Votei no Socrates para tirar o país da bancarrota. Para depois ele nos endividar outra vez com aeroportos, TGV's para o Porto, BPN's e BPP's, rebentar com a educação e com a justiça. Não vale a pena chorar. As coisas sempre foram mais ou menos assim, e lá temos sobrevivido. Na dúvida, mais vale rir.
À falta de melhor, esqueçamos a treta do dever cívico: o voto é um direito lúdico. Por exemplo: imaginem qual foi o prazer que me deu ver a cara do João Soares quando eu votei no Santana Lopes. O homem bem se queixou dos votos da esquerda que foram indevidamente parar ao Santana. Seria meu dever cívico votar nele? É verdade que eu não podia sonhar quanto é que me custaria a brincadeira. Como também não sei qual seria a conta que o João me apresentaria, mais vale lembrar-me que o consulado do Santana foi o mais divertido de sempre.
Azar, azar é a Manuela não ter graça nenhuma. Mas a cara do Pedro quinze dias depois, sempre pode equilibrar as coisas. Votar é um assunto sério? Votei no Socrates para tirar o país da bancarrota. Para depois ele nos endividar outra vez com aeroportos, TGV's para o Porto, BPN's e BPP's, rebentar com a educação e com a justiça. Não vale a pena chorar. As coisas sempre foram mais ou menos assim, e lá temos sobrevivido. Na dúvida, mais vale rir.
domingo, setembro 13
Mecanismos
Se se faz um teste a meio do semestre, vamos aceitar que vão ao teste alunos que tenham faltado a mais de 20% das aulas? Será que devemos antes colocar a fasquia nos 10%? Se nos decidirmos pelos 25%, um professor deverá ter liberdades para aceitar um aluno que tenha faltado a 26,3% das aulas? Haverá mesmo necessidade de deliberar colectivamente sobre estes temas e uniformizar tudo? Até ao mínimo detalhe? Que convicções destinguem um apoiante dos 20% de alguém que prefira os 25? Não podem ser assim tão profundas. Que leva algumas pessoas a baterem-se pela imposição destas regras?
Quais são as semelhanças e as diferenças entre estas questões e outras bem mais mediáticas, do tipo: Só se pode chamar casamento a uma união entre pessoas de sexos diferentes? Só se pode morrer de uma forma? Suicídio e eutanásia são crimes? Alguém pode decidir por nós sobre fazer um aborto? As touradas devem ser proibidas por toda a parte?
Dirão alguns que neste segundo caso estão em jogo convicções profundas.
No primeiro caso, quais são as motivações das pessoas? Basta ouvir as suas justificações. Se todos usarmos a mesma bitola, não podemos ser postos em causa pelos estudantes, os responsáveis das licenciaturas, o conselho pedagógico. Não temos de nos preocupar com os assuntos, não temos de pensar neles, não somos responsáveis. Era assim que funcionava a sociedade algumas gerações atrás. Em muitos países do mundo as pessoas continuam a não se perguntar se são felizes no casamento, se realmente fazem ou não sentido para elas toda uma série de rituais /obrigações que repetem/cumprem sem verdadeiramente os sentir, se estão realmente a fazer da sua vida aquilo que queriam fazer. Na nossa sociedade, a liberdade criou-nos a ansiedade da escolha. Ainda não aprendemos a lidar com ela.
Tenho dúvidas que os mecanismos que levam alguns de nós a querer decidir por mim como posso casar, ter filhos ou morrer, sejam muito diferentes dos mecanismos que levam outros de nós a querer decidir por mim que número é mais bonito: o 15, o 20 ou o 25?
Quais são as semelhanças e as diferenças entre estas questões e outras bem mais mediáticas, do tipo: Só se pode chamar casamento a uma união entre pessoas de sexos diferentes? Só se pode morrer de uma forma? Suicídio e eutanásia são crimes? Alguém pode decidir por nós sobre fazer um aborto? As touradas devem ser proibidas por toda a parte?
Dirão alguns que neste segundo caso estão em jogo convicções profundas.
No primeiro caso, quais são as motivações das pessoas? Basta ouvir as suas justificações. Se todos usarmos a mesma bitola, não podemos ser postos em causa pelos estudantes, os responsáveis das licenciaturas, o conselho pedagógico. Não temos de nos preocupar com os assuntos, não temos de pensar neles, não somos responsáveis. Era assim que funcionava a sociedade algumas gerações atrás. Em muitos países do mundo as pessoas continuam a não se perguntar se são felizes no casamento, se realmente fazem ou não sentido para elas toda uma série de rituais /obrigações que repetem/cumprem sem verdadeiramente os sentir, se estão realmente a fazer da sua vida aquilo que queriam fazer. Na nossa sociedade, a liberdade criou-nos a ansiedade da escolha. Ainda não aprendemos a lidar com ela.
Tenho dúvidas que os mecanismos que levam alguns de nós a querer decidir por mim como posso casar, ter filhos ou morrer, sejam muito diferentes dos mecanismos que levam outros de nós a querer decidir por mim que número é mais bonito: o 15, o 20 ou o 25?
sexta-feira, agosto 28
OTAS
A questão essencial nunca foi Ota ou não Ota mas sim proporcionar ou não negócios a certas pessoas. Entretanto as obras de ampliação da Portela continuam alegremente. Desde o princípio da crise que quem passa por lá nota uma queda acentuada de tráfego. Mas foi a primeira vez que lá passei a meio de Agosto nestes últimos anos. O aeroporto estava às moscas. Quem precisa do novo aeroporto?
quarta-feira, agosto 26
O medo de serviço
Dizia um jornalista no outro dia: espera-se que este inverno morram mais de mil pessoas com a gripe mexicana. Apesar de tudo acabou por reconhecer: com a gripe normal, costumam morrer mais pessoas. Nesse caso, para quê tantos planos de contingência e tanta confusão à volta da gripe? Bem, a verdade é que o terrorismo já não mete medo a ninguém, os comunistas e a ameaça nuclear também não, o aquecimento global está em crise. A Crise já não assusta ninguém que tenha conservado o emprego. Muita gente não se sente confortavel sem um medo fresquinho. Sobretudo, os jornais têm de vender. Nada vende tanto como o medo.
Quem tiver alguma responsabilidade e não participar na histeria generalizada torna-se automaticamente responsável por tudo o que venha a acontecer. Até apareceram logo umas ameaças de prisão, não vá alguém brincar com o assunto. Ontem um jornal reproduzia as opiniões de um comandante de bombeiros sobre as medidas a tomar para combater a Ameaça. E porque não um gestor informático, um controlador de tráfico aéreo ou um jogador de bridge?
Nada como um bom medo para nos afastar dos medos mais sérios, aqueles que preferimos esquecer. Acreditar neste medo permite-nos crer por um instante que a morte é uma brincalhona que nos prega umas partidas de vez em quando. Quem estiver atento e tomar todos os tamiflus que forem sendo inventados talvez lhe consiga escapar indefinidamente. Mas não é assim, pois não?
Do mal o menos, salvou-se a rica semana que eu acabei de passar no México por metade do preço, cortesia do Correio da Manhã e da TVI. Aqui fica o meu obrigado.
Quem tiver alguma responsabilidade e não participar na histeria generalizada torna-se automaticamente responsável por tudo o que venha a acontecer. Até apareceram logo umas ameaças de prisão, não vá alguém brincar com o assunto. Ontem um jornal reproduzia as opiniões de um comandante de bombeiros sobre as medidas a tomar para combater a Ameaça. E porque não um gestor informático, um controlador de tráfico aéreo ou um jogador de bridge?
Nada como um bom medo para nos afastar dos medos mais sérios, aqueles que preferimos esquecer. Acreditar neste medo permite-nos crer por um instante que a morte é uma brincalhona que nos prega umas partidas de vez em quando. Quem estiver atento e tomar todos os tamiflus que forem sendo inventados talvez lhe consiga escapar indefinidamente. Mas não é assim, pois não?
Do mal o menos, salvou-se a rica semana que eu acabei de passar no México por metade do preço, cortesia do Correio da Manhã e da TVI. Aqui fica o meu obrigado.
sábado, agosto 8
sexta-feira, junho 26
domingo, junho 14
domingo, junho 7
... e viva o RUI TAVARES!
Daqueles candidatos todos, é o único que diz com regularidade algo que me faça pensar. O único que alguma vez me fez pensar...
O último a ser eleito, é o primeiro. Valeu a pena votar no Bloco.
Mas onde eu queria votar mesmo, era no Pirate Party, que elegeu o primeiro deputado. Um partido tão importante quanto alguma vez se pensou que os verdes poderiam ser.
Foram até ao aeroporto da Portela nos ultimos tempos? Em que ano é que é suposto o aeroporto já não chegar para as necessidades? Alguém fez um estudo depois da crise internacional começar? Vamos deixar o Socrates empenhar-nos até à sétima geração? Que estes três meses passem bem depressa...
The day after: O MEP obteve um excelente resultado. Parece que entrou logo para o sexto lugar, com 1,5% dos votos. Ainda acabam por eleger um deputado em Setembro...
O último a ser eleito, é o primeiro. Valeu a pena votar no Bloco.
Mas onde eu queria votar mesmo, era no Pirate Party, que elegeu o primeiro deputado. Um partido tão importante quanto alguma vez se pensou que os verdes poderiam ser.
Foram até ao aeroporto da Portela nos ultimos tempos? Em que ano é que é suposto o aeroporto já não chegar para as necessidades? Alguém fez um estudo depois da crise internacional começar? Vamos deixar o Socrates empenhar-nos até à sétima geração? Que estes três meses passem bem depressa...
The day after: O MEP obteve um excelente resultado. Parece que entrou logo para o sexto lugar, com 1,5% dos votos. Ainda acabam por eleger um deputado em Setembro...
quinta-feira, maio 28
As aventuras de Psyche 2
Psyche está maravilhada com o seu novo destino. Eros a visita-a todas as noites, invisível. Ela descobre com alegria que ficou grávida. Eros diz-lhe que pode fazer tudo aquilo que desejar naquele paraíso, desde que lhe prometa não lhe fazer perguntas nem tentar vê-lo. Feliz perante a inesperada reviravolta do seu destino, Psyche aceita estas regras.
As irmãs de Psyche descobrem o que lhe aconteceu. A sua inveja é sem limites. Conseguem contactá-la. Eros avisa-a: elas vão tentar corrompê-la com intrigas. Se ela cumprir a sua promessa, dará à luz um Deus. Caso contrário, dará à luz uma mortal. Além disso, tudo acabará entre eles. Psyche reafirma as suas promessas.
As irmãs voltam a insistir. Não será o marido dela uma serpente? Não irá ela comer o próprio filho quando este nascer? Psyche arranja uma lamparina e a mais afiada das facas. A meio da noite acende a lamparina e empunha a faca enquanto descobre o lençol que tapava Eros. Maravilhada pela sua beleza e envergonhada por ter ter cumprido a promessa, Psyche recua, ferindo-se numa das flechas de Eros. Fica ainda mais apaixonada, se tal é possível. É então que derrama o óleo quente da lamparina sobre o ombro direito de Eros, que voa para longe. Ela persegue-o. No momento em que o perde de vista repara que já não se encontra no Vale do Paraíso. Não consegue encontrar o caminho de volta.
As irmãs de Psyche descobrem o que lhe aconteceu. A sua inveja é sem limites. Conseguem contactá-la. Eros avisa-a: elas vão tentar corrompê-la com intrigas. Se ela cumprir a sua promessa, dará à luz um Deus. Caso contrário, dará à luz uma mortal. Além disso, tudo acabará entre eles. Psyche reafirma as suas promessas.
As irmãs voltam a insistir. Não será o marido dela uma serpente? Não irá ela comer o próprio filho quando este nascer? Psyche arranja uma lamparina e a mais afiada das facas. A meio da noite acende a lamparina e empunha a faca enquanto descobre o lençol que tapava Eros. Maravilhada pela sua beleza e envergonhada por ter ter cumprido a promessa, Psyche recua, ferindo-se numa das flechas de Eros. Fica ainda mais apaixonada, se tal é possível. É então que derrama o óleo quente da lamparina sobre o ombro direito de Eros, que voa para longe. Ela persegue-o. No momento em que o perde de vista repara que já não se encontra no Vale do Paraíso. Não consegue encontrar o caminho de volta.
segunda-feira, maio 25
As aventuras de Psyche 1
Algures num reino muito distante uma rainha deu à luz a sua terceira princesa. Os ventos espalharam pela terra o quanto era impossível explicar por palavras a beleza, a inocência e a virginalidade de Psyche. Dizia-se até que um dia ela acabaria por destronar a deusa Afrodite no coração de todos os homens.
As qualidades que levavam os homens a venerá-la acabavam também por os intimidar. A idade do casamento aproximava-se e nenhum pretendente surgia. O rei achou por bem consultar um oráculo. Invejosa e vingativa, Afrodite levou o oráculo a determinar que só a Morte poderia desposar Psyche. Ela deveria ser deveria ser acorrentada a uma rocha no topo da mais alta montanha do reino, onde ficaria à mercê da mais horrível das criaturas.
Ninguém se atrevia a não respeitar a decisão do oráculo. Afrodite não se deu por satisfeita. Ordenou ao seu filho Eros que atingisse Psyche com uma das suas flechas momentos antes do monstro a despedaçar. A sua vingança só seria completa se a virgem se entregasse ao monstro. Quando preparava a flecha, Eros feriu-se nela. Nem ele próprio escapa à sua magia. Apaixonado por Psyche, Eros pede ao seu amigo, o Vento de Oeste, que a liberte e a leve para o Vale do Paraíso.
continua
As qualidades que levavam os homens a venerá-la acabavam também por os intimidar. A idade do casamento aproximava-se e nenhum pretendente surgia. O rei achou por bem consultar um oráculo. Invejosa e vingativa, Afrodite levou o oráculo a determinar que só a Morte poderia desposar Psyche. Ela deveria ser deveria ser acorrentada a uma rocha no topo da mais alta montanha do reino, onde ficaria à mercê da mais horrível das criaturas.
Ninguém se atrevia a não respeitar a decisão do oráculo. Afrodite não se deu por satisfeita. Ordenou ao seu filho Eros que atingisse Psyche com uma das suas flechas momentos antes do monstro a despedaçar. A sua vingança só seria completa se a virgem se entregasse ao monstro. Quando preparava a flecha, Eros feriu-se nela. Nem ele próprio escapa à sua magia. Apaixonado por Psyche, Eros pede ao seu amigo, o Vento de Oeste, que a liberte e a leve para o Vale do Paraíso.
continua
sábado, maio 23
segunda-feira, maio 18
Mais uns quantos estereótipos
Podemos assistir ao longo dos tempos a um "conflito dialéctico" entre as posições políticas mais conservadoras e as mais progressistas. Parece-me claro que ninguém tem propriamente razão. A situação tem evoluído de formas por vezes bem inesperadas. Quando escrevi este post comparava as oposições direita/esquerda e crentes/ateus. Neste segundo caso não conseguia imaginar como é que a razão podia ser de alguma forma partilhada pelos dois lados. Era essa a ideia principal que queria exprimir. O post foi um flop. Quando a Madi apareceu a comentar, o que não fazia há muito tempo, senti-me na obrigação de dizer que
não se nota nada mas isto ( o blog) vai avançando. É preciso olhar com muita atenção.
A verdade é que estávamos a ter mais uma estúpida guerra crentes/descrentes. Vamos lá a ver se a perspectiva que se segue muda alguma coisa. Pelo menos não agrada gregos ou a troianos, o que já não é mau.
não se nota nada mas isto ( o blog) vai avançando. É preciso olhar com muita atenção.
A verdade é que estávamos a ter mais uma estúpida guerra crentes/descrentes. Vamos lá a ver se a perspectiva que se segue muda alguma coisa. Pelo menos não agrada gregos ou a troianos, o que já não é mau.
Digamos que existem pelo menos cinco níveis de consciência humana.
1. Não temos uma consciência clara da fronteira entre nós e o mundo que nos rodeia. Uma criança de colo não distingue claramente onde é que ela acaba e a sua mãe começa. Todos nós podemos ter recaídas a este nível. Quantas pessoas ficam doentes quando o seu carro tem um problema ou o seu clube perde um jogo.
2. Passamos a diferenciar as nossas percepções daquilo que percepcionamos. Deixamos de nos projectar sobre tudo o que nos rodeia. Passamos a projectar partes de nós sobre algumas pessoas que nos rodeiam. Uma criança acha que a mãe sabe tudo e pode fazer milagres, que o pai tudo pode fazer e é o homem mais forte do mundo. Na adolescência essas projecções passam a recair sobre os amigos mais velhos e as estrelas rock. Os pais passam a não saber nada de nada. Os adultos voltam a realizar este tipo de projecções sempre que se apaixonam.
3. Nesta fase a omnipotência e a omnisciência já não são projectadas sobre pessoas mas sobre entidades abstractas (princípios, símbolos ou ensinamentos) ou instituições: Deus, o Destino, a Verdade. Torna-se possível o pensamento teológico e filosófico. Nas formas mais primitivas deste nível Deus encarna ainda as funções dos pais, sendo-lhes atribuído o poder de punir ou recompensar as pessoas de forma antropomórfica.
Nesta fase deixamos de nos guiar ao sabor da emoção do momento e da empatia inconsciente, passando a seguir regras e valores. Passamos a fazer aquilo que achamos correcto do ponto de vista ecológico não porque ficamos doentes de raiva quando testemunhamos a destruição da natureza mas devido a um imperativo moral que faz parte de um conjunto de valores razoavelmente coerente.
4. Dá-se a extinção radical das projecções. Deixa de existir um sentido a priori na vida. Deixa-se de acreditar na imortalidade. Dá-se um passo em frente no sentido da objectividade. Funciona? passa a ser a questão fundamental. Vê-se a relatividade dos princípios em que se acredita. Os valores pessoais são expressos em termos de talvez, não tenho a certeza. O ateísmo pode ou não ser completamente assumido.
O estádio 4 é altamente perigoso. Aquilo que se ganhou em clareza nem sempre é compensado por aquilo que se perdeu em significado. Muitas pessoas conseguem viver lidar com este estádio de consciência, mantendo uma real ou aparente estabilidade. Outras acabam por regredir para estádios mais primitivos ou passar por neuroses graves. Uma sociedade onde uma boa parte da elite está no nível quatro está condenada a passar por dificuldades graves. Estas pessoas acabam por de alguma forma minar a crença das restantes pessoas, sem lhes apresentar alternativas que lhes sirvam.
5. Que fazer quando nos apercebemos dos problemas criados pelo nível quatro? Que tal uma revolução coperniciana? Tal como a Terra não é o centro do mundo, talvez o Ego não seja o centro da nossa personalidade. Talvez seja apenas a ponte de um grande iceberg mergulhado no nosso inconsciente. Mergulhando nesse oceano, talvez encontremos algo que dê um significado às nossas vidas. Talvez até seja algo parecido com aquilo que muitas religiões afirmam. E também bastante diferente.
2. Passamos a diferenciar as nossas percepções daquilo que percepcionamos. Deixamos de nos projectar sobre tudo o que nos rodeia. Passamos a projectar partes de nós sobre algumas pessoas que nos rodeiam. Uma criança acha que a mãe sabe tudo e pode fazer milagres, que o pai tudo pode fazer e é o homem mais forte do mundo. Na adolescência essas projecções passam a recair sobre os amigos mais velhos e as estrelas rock. Os pais passam a não saber nada de nada. Os adultos voltam a realizar este tipo de projecções sempre que se apaixonam.
3. Nesta fase a omnipotência e a omnisciência já não são projectadas sobre pessoas mas sobre entidades abstractas (princípios, símbolos ou ensinamentos) ou instituições: Deus, o Destino, a Verdade. Torna-se possível o pensamento teológico e filosófico. Nas formas mais primitivas deste nível Deus encarna ainda as funções dos pais, sendo-lhes atribuído o poder de punir ou recompensar as pessoas de forma antropomórfica.
Nesta fase deixamos de nos guiar ao sabor da emoção do momento e da empatia inconsciente, passando a seguir regras e valores. Passamos a fazer aquilo que achamos correcto do ponto de vista ecológico não porque ficamos doentes de raiva quando testemunhamos a destruição da natureza mas devido a um imperativo moral que faz parte de um conjunto de valores razoavelmente coerente.
4. Dá-se a extinção radical das projecções. Deixa de existir um sentido a priori na vida. Deixa-se de acreditar na imortalidade. Dá-se um passo em frente no sentido da objectividade. Funciona? passa a ser a questão fundamental. Vê-se a relatividade dos princípios em que se acredita. Os valores pessoais são expressos em termos de talvez, não tenho a certeza. O ateísmo pode ou não ser completamente assumido.
O estádio 4 é altamente perigoso. Aquilo que se ganhou em clareza nem sempre é compensado por aquilo que se perdeu em significado. Muitas pessoas conseguem viver lidar com este estádio de consciência, mantendo uma real ou aparente estabilidade. Outras acabam por regredir para estádios mais primitivos ou passar por neuroses graves. Uma sociedade onde uma boa parte da elite está no nível quatro está condenada a passar por dificuldades graves. Estas pessoas acabam por de alguma forma minar a crença das restantes pessoas, sem lhes apresentar alternativas que lhes sirvam.
5. Que fazer quando nos apercebemos dos problemas criados pelo nível quatro? Que tal uma revolução coperniciana? Tal como a Terra não é o centro do mundo, talvez o Ego não seja o centro da nossa personalidade. Talvez seja apenas a ponte de um grande iceberg mergulhado no nosso inconsciente. Mergulhando nesse oceano, talvez encontremos algo que dê um significado às nossas vidas. Talvez até seja algo parecido com aquilo que muitas religiões afirmam. E também bastante diferente.
sexta-feira, maio 1
Brunello
Depois de outro troço de estrada, ouvimos ruídos, e numa curva aparece um grupo agitado de monges e servos. Um deles veio ao nosso encontro com grande urbanidade:
- Bem-vindo senhor, e não vos admireis se imagino quem sois, porque fomos advertidos da vossa visita. Eu sou o despenseiro. E se vós sois, como creio, frei Guilherme de Baskerville, o abade deve ser avisado.
Tu, sobe a avisar que o nosso visitante está prestes a entrar a cerca!
- Agradeço-vos, senhor despenseiro - respondeu cordialmente o meu mestre - e tanto mais aprecio a cortesia quanto para em saudar haveis interrompido a perseguição. Mas não temais, o cavalo passou por aqui e dirigiu-se para o carreiro da direita. Não poderá ir muito longe, porque chegando ao depósito de estrume terá de parar. É demasiado inteligente para se lançar pelo terreno íngreme.
- Quando o haveis visto? - perguntou o despenseiro.
- Não o vimos de modo algum, mas se procurais Brunello, o animal não pode estar senão onde eu disse.
O despenseiro hesitou, fitou Guilherme, depois o caminho e perguntou:
- Brunello, como sabeis?
- Vamos - disse Guilherme - é evidente que andais à procura de Brunello, o cavalo preferido do Abade,o melhor galopador da vossa estrebaria, de pelo negro, cinco pés de altura, cauda majestosa, casco pequeno e redondo mas de galope bem regular; cabeça miúda, orelhas finas mas olhos grandes. Foi para a direita, digo-vos, e apressai-vos, em todo o caso.
O despenseiro teve um momento de hesitação, depois fez um sinal aos seus e lançou-se pelo caminho da direita, enquanto os nossos machos continuavam a subir. Quando estava para interrogar Guilherme, porque me roía a curiosidade, ele fez-me sinal para esperar: e, de facto, poucos minutos depois ouvimos gritos de júbilo, e na curva do caminho reapareceram os monges e servos trazendo o cavalo pelo freio. Passaram ao nosso lado, continuando a olhar-nos algo atónitos, e precederam-nos em direcção à abadia. Creio mesmo que Guilherme afrouxava o passo à sua mula para lhes permitir contar o que tinha sucedido.
- E agora dizei-me - por fim não soube conter-me - como fizeste para saber?
- Meu bom Adso - disse o mestre. - Em toda a viagem te tenho ensinado a reconhecer os traços com que o mundo nos fala como um grande livro. Quase me envergonho de te dizer aquilo que deverias saber. No trívio, sobre a neve ainda fresca, desenhavam-se com muita clareza as pegadas dos cascos de um cavalo que apontava para um carreiro à nossa esquerda. A bela e igual distância uns dos outros aqueles sinais diziam que o casco era pequeno e redondo e o galope de grande regularidade... de modo que daí deduzi a natureza do cavalo e o facto de ele não correr desordenadamente como faz um animal irritado. Ali, onde os pinheiros formavam como que um tecto natural, alguns ramos tinham sido quebrados de fresco justamente à altura de cinco pés. Um dos silvados de amoras, por onde o animal deve ter andado para meter pelo caminho à direita, conservava ainda entre os espinhos belas crinas negras...
- Sim - disse -, mas a cabeça pequena, as orelhas aguçadas, os olhos grandes...
- Não sei se os tem mas decerto os monges o crêem firmemente. Dizia Isidoro de Sevilha que a beleza de uma animal tal exige. Se o cavalo não fosse o melhor da estrebaria, não se explicava porque a persegui-lo não foram só os moços, mas se incomodou o próprio despenseiro. E um monge que considera um cavalo excelente não pode deixar de o ver como as auctoritates lho descreveram, especialmente se - e aqui sorriu com malícia - é um douto beneditino...
- Está bem - disse - mas porquê Brunello?
- Que o Espírito Santo te ponha miolos na cabeça, meu filho! Que outro nome lhe terias dado se o grande Buridano, que vai ser reitor em Paris, tendo de falar de um cavalo, não encontrou nome mais natural?
- Bem-vindo senhor, e não vos admireis se imagino quem sois, porque fomos advertidos da vossa visita. Eu sou o despenseiro. E se vós sois, como creio, frei Guilherme de Baskerville, o abade deve ser avisado.
Tu, sobe a avisar que o nosso visitante está prestes a entrar a cerca!
- Agradeço-vos, senhor despenseiro - respondeu cordialmente o meu mestre - e tanto mais aprecio a cortesia quanto para em saudar haveis interrompido a perseguição. Mas não temais, o cavalo passou por aqui e dirigiu-se para o carreiro da direita. Não poderá ir muito longe, porque chegando ao depósito de estrume terá de parar. É demasiado inteligente para se lançar pelo terreno íngreme.
- Quando o haveis visto? - perguntou o despenseiro.
- Não o vimos de modo algum, mas se procurais Brunello, o animal não pode estar senão onde eu disse.
O despenseiro hesitou, fitou Guilherme, depois o caminho e perguntou:
- Brunello, como sabeis?
- Vamos - disse Guilherme - é evidente que andais à procura de Brunello, o cavalo preferido do Abade,o melhor galopador da vossa estrebaria, de pelo negro, cinco pés de altura, cauda majestosa, casco pequeno e redondo mas de galope bem regular; cabeça miúda, orelhas finas mas olhos grandes. Foi para a direita, digo-vos, e apressai-vos, em todo o caso.
O despenseiro teve um momento de hesitação, depois fez um sinal aos seus e lançou-se pelo caminho da direita, enquanto os nossos machos continuavam a subir. Quando estava para interrogar Guilherme, porque me roía a curiosidade, ele fez-me sinal para esperar: e, de facto, poucos minutos depois ouvimos gritos de júbilo, e na curva do caminho reapareceram os monges e servos trazendo o cavalo pelo freio. Passaram ao nosso lado, continuando a olhar-nos algo atónitos, e precederam-nos em direcção à abadia. Creio mesmo que Guilherme afrouxava o passo à sua mula para lhes permitir contar o que tinha sucedido.
- E agora dizei-me - por fim não soube conter-me - como fizeste para saber?
- Meu bom Adso - disse o mestre. - Em toda a viagem te tenho ensinado a reconhecer os traços com que o mundo nos fala como um grande livro. Quase me envergonho de te dizer aquilo que deverias saber. No trívio, sobre a neve ainda fresca, desenhavam-se com muita clareza as pegadas dos cascos de um cavalo que apontava para um carreiro à nossa esquerda. A bela e igual distância uns dos outros aqueles sinais diziam que o casco era pequeno e redondo e o galope de grande regularidade... de modo que daí deduzi a natureza do cavalo e o facto de ele não correr desordenadamente como faz um animal irritado. Ali, onde os pinheiros formavam como que um tecto natural, alguns ramos tinham sido quebrados de fresco justamente à altura de cinco pés. Um dos silvados de amoras, por onde o animal deve ter andado para meter pelo caminho à direita, conservava ainda entre os espinhos belas crinas negras...
- Sim - disse -, mas a cabeça pequena, as orelhas aguçadas, os olhos grandes...
- Não sei se os tem mas decerto os monges o crêem firmemente. Dizia Isidoro de Sevilha que a beleza de uma animal tal exige. Se o cavalo não fosse o melhor da estrebaria, não se explicava porque a persegui-lo não foram só os moços, mas se incomodou o próprio despenseiro. E um monge que considera um cavalo excelente não pode deixar de o ver como as auctoritates lho descreveram, especialmente se - e aqui sorriu com malícia - é um douto beneditino...
- Está bem - disse - mas porquê Brunello?
- Que o Espírito Santo te ponha miolos na cabeça, meu filho! Que outro nome lhe terias dado se o grande Buridano, que vai ser reitor em Paris, tendo de falar de um cavalo, não encontrou nome mais natural?
segunda-feira, abril 27
Greg House 2
A forma obsessiva com House tenta convencer os amigos sobre a importância de conhecer o lado mau das coisas é patética. Cai num negativismo sem sentido. Leva-nos a ignorar o caminho que House nos propõe.
O facto ele torturar constantemente os ajudantes é completamente diferente. Faz todo o sentido. Eles estão ali para aprender com ele. Aquilo que ele sabe e os outros médicos não sabem. O que é que o diferencia dos outros médicos? A sua aceitação do seu lado negro. Ele tem de os pôr em contacto com os seus lados negros. Eles querem aprender com House tudo, menos aquilo que mais precisam de aprender... Ele não lhes explica este facto? Por um lado eles não o levariam a sério. Se o levassem a sério, a táctica perdia a eficácia...
Porque é que Chase e Cameron abandonaram a equipa? Porque a sua capacidade de evoluir no contacto com as suas sombras estava esgotado. Foreman, que esteve preso por roubar carros e tem mais um par de anos, está em condições de continuar a evoluir.
Mal abandonaram a equipa Chase e Cameron passaram a ser pessoas mais confiantes. Temos aqui mais uma manipulação da série. Eles não se tornaram pessoas mais confiantes por terem abandonado o House mas por terem trabalhado todo aquele tempo com ele.
Porque é que o House passou uma época inteira a escolher pessoas? Sem dúvida que introduziu um novo ritmo na série. Parece-me no entanto que há uma razão mais profunda. Os autores não se sentiram seguros de construir personagens que garantissem uma progressão credível e interessante das suas personalidades durante várias épocas. Nunca ninguém tinha experimentado algo assim e eles já tinham tido um insucesso parcial com o casalinho de médicos. Criaram várias personagens, puseram-nas a interagir com o House e no fim escolheram as que tinham mais hipoteses de continuar a evoluir interiormente.
Um problema: as necessidades comerciais da série exigem que um dos assistentes do House seja uma mulher jovem e bonita. Demasiado jovem para mergulhar suficientemente fundo no seu inconsciente, uma tarefa para a segunda metade da vida. Como resolver o problema? A doença de Huntington dá um jeitão...
Porque é que Chase e Cameron abandonaram a equipa? Porque a sua capacidade de evoluir no contacto com as suas sombras estava esgotado. Foreman, que esteve preso por roubar carros e tem mais um par de anos, está em condições de continuar a evoluir.
Mal abandonaram a equipa Chase e Cameron passaram a ser pessoas mais confiantes. Temos aqui mais uma manipulação da série. Eles não se tornaram pessoas mais confiantes por terem abandonado o House mas por terem trabalhado todo aquele tempo com ele.
Porque é que o House passou uma época inteira a escolher pessoas? Sem dúvida que introduziu um novo ritmo na série. Parece-me no entanto que há uma razão mais profunda. Os autores não se sentiram seguros de construir personagens que garantissem uma progressão credível e interessante das suas personalidades durante várias épocas. Nunca ninguém tinha experimentado algo assim e eles já tinham tido um insucesso parcial com o casalinho de médicos. Criaram várias personagens, puseram-nas a interagir com o House e no fim escolheram as que tinham mais hipoteses de continuar a evoluir interiormente.
Um problema: as necessidades comerciais da série exigem que um dos assistentes do House seja uma mulher jovem e bonita. Demasiado jovem para mergulhar suficientemente fundo no seu inconsciente, uma tarefa para a segunda metade da vida. Como resolver o problema? A doença de Huntington dá um jeitão...
sábado, abril 25
Gregory House: Solitude and Loneliness
Solitude e Loneliness são normalmente traduzidas por solidão. No entanto não significam exactamente a mesma coisa. Podemos sentir-nos sózinhos no meio de uma multidão. Isso é lonliness. Podemos estar sós e encher o espaço à nossa volta. Isso é solitude without lonliness. Não é possível realizar qualquer trabalho criativo sem ser capaz de estar só. Porque qualquer trabalho criativo envolve algum tipo de contacto com o inconsciente.
O argumento de House gira em torno da personalidade do protagonista e das tensões entre ele e os outros personagens. Não é mais uma série de médicos. Porque é que House é médico? Porque não se pode deixar de levar a sério alguém que é capaz de salvar vidas que outros não são capazes de salvar. É essencial que se mantenha a tensão: ninguém acredita no House, ele diz as coisas mais loucas, mas nós acreditamos. O enigma que House acaba por resolver no fim de cada episódio serve essencialmente para realçar mais uma vez a sua excepcional perspicácia.
Donde provém o magnetismo pessoal de House? Donde provem a sua capacidade de compreender as situações? A resposta à segunda pergunta é clara: tem alguma coisa a ver com o facto de Greg House estar em contacto com o seu lado negro, a sua Sombra. Se pensarem bem, a forma como ele chega ao pé de alguém desconhecido e consegue o que quer também tem a mesma origem.
As pessoas não estão umas do lado do Darth Vader e outras do lado do Luke SkyWalker. Temos os dois dentro de nós. Temos de reconhecer o Darth Vader que está em nós. Only then, can we use the force! É esta a mensagem que Greg House tenta transmitir a toda a gente, a toda a hora. Ninguém a quer ouvir.
A mensagem fundamental da série é outra: House está certo, mas está errado. Ele está em contacto com a verdade, mas o preço a pagar é a lonliness, uma vida miseravel. É bem melhor abdicar de estar em contacto com a verdade. Quantos jovens inteligentes e ambiciosos terão comprado esta tese? A forma rasteira como a FOX usa a confusão entre solitude e lonliness é típica da mais reaccionária cadeia de televisão dos Estados Unidos.
(continua)
O argumento de House gira em torno da personalidade do protagonista e das tensões entre ele e os outros personagens. Não é mais uma série de médicos. Porque é que House é médico? Porque não se pode deixar de levar a sério alguém que é capaz de salvar vidas que outros não são capazes de salvar. É essencial que se mantenha a tensão: ninguém acredita no House, ele diz as coisas mais loucas, mas nós acreditamos. O enigma que House acaba por resolver no fim de cada episódio serve essencialmente para realçar mais uma vez a sua excepcional perspicácia.
Donde provém o magnetismo pessoal de House? Donde provem a sua capacidade de compreender as situações? A resposta à segunda pergunta é clara: tem alguma coisa a ver com o facto de Greg House estar em contacto com o seu lado negro, a sua Sombra. Se pensarem bem, a forma como ele chega ao pé de alguém desconhecido e consegue o que quer também tem a mesma origem.
As pessoas não estão umas do lado do Darth Vader e outras do lado do Luke SkyWalker. Temos os dois dentro de nós. Temos de reconhecer o Darth Vader que está em nós. Only then, can we use the force! É esta a mensagem que Greg House tenta transmitir a toda a gente, a toda a hora. Ninguém a quer ouvir.
A mensagem fundamental da série é outra: House está certo, mas está errado. Ele está em contacto com a verdade, mas o preço a pagar é a lonliness, uma vida miseravel. É bem melhor abdicar de estar em contacto com a verdade. Quantos jovens inteligentes e ambiciosos terão comprado esta tese? A forma rasteira como a FOX usa a confusão entre solitude e lonliness é típica da mais reaccionária cadeia de televisão dos Estados Unidos.
(continua)
sexta-feira, abril 24
quarta-feira, abril 22
As Sombras do Senhor Neves
A seguir à segunda guerra um número crescente de famílias americanas viviam longe dos seus pais. Não tinham com quem conversar quando tinham alguma dúvida sobre como cuidar dos seus filhos. O Dr. Benjamin Spock publicou em 1946 Baby and Child Care (Meu Filho, Meu Tesouro). Este livro foi um dos maiores best-sellers de sempre. Distinguia-se pelo seu bom senso e pelo seu calor humano.
Muitos anos mais tarde os seus filhos vieram a público explicar como o seu pai fora sempre um homem frio e distante e como isso os marcara irreparavelmente para toda a vida. É trágico que tal tenha acontecido, mas isso não muda uma vírgula ao mais importante. A geração dos baby-boomers cresceu mais equilibrada e confiante do que as que a precederam em parte graças ao talento do Dr. Spock. O esforço de Benjamin para apresentar ao mundo a Persona do pediatra perfeito ajudou a criar uma Sombra sinistra, só conhecida dos que partilhavam o seu tecto.
Vem isto a propósito do artigo de João César das Neves citado no Jardim de Luz. Este senhor critica Jean-Jacques Rousseau, Karl Marx, Bertrand Russell e Jean-Paul Sartre, entre muitos outros ódios de estimação. Tal como com Frei Tomás, é melhor fazer como eles dizem, do que como eles fizeram. César das Neves dá a entender que a existências destas sombras na vida destes homens destroi a credibilidade das suas obras.
Quanto mais alto subimos maior a sombra que projectamos. Há que aceitá-la, admitir a sua existência sem vergonha e tentar integrá-la na nossa personalidade. Nada pior do que tentar pura e simplesmente reprimi-la e escondê-la debaixo do tapete. Não resulta. Cada pessoa tem a sua Sombra e só um pobre Diabo se lembraria de vir para os jornais apregoar o contrário.
César das Neves dificilmente alguma vez escreverá um artigo sobre o novo caso de pedofilia que ensombra a igreja católica da Irlanda. Neste caso a sombra não destroi a obra? Negar a existência desta sombra nada resolve...
O ritual da confissão católica pode ser um excelente meio para reconhecer as nossas sombras e integrá-las na personalidade. Aceitá-las como parte de nós próprios. Quantas vezes serve apenas para manter a ilusão de que as nossas sombras podem ser deitadas fora?
Muitos anos mais tarde os seus filhos vieram a público explicar como o seu pai fora sempre um homem frio e distante e como isso os marcara irreparavelmente para toda a vida. É trágico que tal tenha acontecido, mas isso não muda uma vírgula ao mais importante. A geração dos baby-boomers cresceu mais equilibrada e confiante do que as que a precederam em parte graças ao talento do Dr. Spock. O esforço de Benjamin para apresentar ao mundo a Persona do pediatra perfeito ajudou a criar uma Sombra sinistra, só conhecida dos que partilhavam o seu tecto.
Vem isto a propósito do artigo de João César das Neves citado no Jardim de Luz. Este senhor critica Jean-Jacques Rousseau, Karl Marx, Bertrand Russell e Jean-Paul Sartre, entre muitos outros ódios de estimação. Tal como com Frei Tomás, é melhor fazer como eles dizem, do que como eles fizeram. César das Neves dá a entender que a existências destas sombras na vida destes homens destroi a credibilidade das suas obras.
Quanto mais alto subimos maior a sombra que projectamos. Há que aceitá-la, admitir a sua existência sem vergonha e tentar integrá-la na nossa personalidade. Nada pior do que tentar pura e simplesmente reprimi-la e escondê-la debaixo do tapete. Não resulta. Cada pessoa tem a sua Sombra e só um pobre Diabo se lembraria de vir para os jornais apregoar o contrário.
César das Neves dificilmente alguma vez escreverá um artigo sobre o novo caso de pedofilia que ensombra a igreja católica da Irlanda. Neste caso a sombra não destroi a obra? Negar a existência desta sombra nada resolve...
O ritual da confissão católica pode ser um excelente meio para reconhecer as nossas sombras e integrá-las na personalidade. Aceitá-las como parte de nós próprios. Quantas vezes serve apenas para manter a ilusão de que as nossas sombras podem ser deitadas fora?
segunda-feira, abril 20
Descer a rua
Desço a rua.
Há um grande buraco no passeio.
Caio nele.
Estou perdido ... desamparado...
A culpa não é minha!
Levo um tempo infinito a sair do buraco.
Desço a rua.
Há um grande buraco no passeio.
Faço por não o ver.
Caio nele.
Não posso crer que voltou a acontecer!
Mas a culpa não é minha!
É dificil sair do buraco.
Desço a rua.
Há um grande buraco no passeio.
Estou a vê-lo.
Volto a cair nele ... é um hábito ... mas
os meus olhos estão abertos.
Sei onde estou.
A culpa é minha.
Saio do buraco rapidamente.
Desço a rua.
Há um grande buraco no passeio.
Desvio-me dele.
Desço outra rua.
Há um grande buraco no passeio.
Caio nele.
Estou perdido ... desamparado...
A culpa não é minha!
Levo um tempo infinito a sair do buraco.
Desço a rua.
Há um grande buraco no passeio.
Faço por não o ver.
Caio nele.
Não posso crer que voltou a acontecer!
Mas a culpa não é minha!
É dificil sair do buraco.
Desço a rua.
Há um grande buraco no passeio.
Estou a vê-lo.
Volto a cair nele ... é um hábito ... mas
os meus olhos estão abertos.
Sei onde estou.
A culpa é minha.
Saio do buraco rapidamente.
Desço a rua.
Há um grande buraco no passeio.
Desvio-me dele.
Desço outra rua.
sábado, abril 18
Rituais de Transição
Um casamento cigano dura três dias.
Algumas vezes as famílias dos noivos ficam endividadas.
Um desperdício?
Ao fim dos três dias todos os intervenientes interiorizaram o facto de que aqueles dois jovens se casaram e entraram numa nova etapa das suas vidas.
Muitos ajustes que se iriam realizar ao longo de uma década entre os noivos e as suas famílias foram realizados em poucas horas, num ambiente bastante mais propício, enquanto cantavam, comiam e dançavam.
Esses ajustes podem gastar muita energia, muito tempo e muito dinheiro.
Talvez o gasto tenha sido um bom investimento...
Na nossa sociedade o casamento era essencialmente uma cerimónia centrada na noiva. O seu dia de glória. Em troca ela abdicava da sua identidade em prole da harmonia da sua futura família. Para o resto da sua vida.
É claro que se uma cerimónia do casamento já não cumpre nenhum propósito e se transforma apenas em mais uma forma de consumismo, mais vale guardar a massa para outro fim.
A transição mais importante das nossas vidas é a entrada na idade adulta.
Esta transição era acompanhada de rituais que nos ajudavam a compreender e ajustar a essas mudanças. Nalgumas sociedades as crianças eram ritualmente raptadas das suas familias, era-lhes dado a conhecer os segredos da tribo e da vida adulta. Chegar à idade adulta era considerado algo inquestionavelmente positivo. Nunca mais se falava nisso.
A nossa sociedade acabou com a maioria desses rituais. Os segredos da tribo já não se podem transmitir numa semana ou num mês. Já não se ordenam cavaleiros nem se cumpre o serviço militar obrigatório. Até as mais elementares cerimónias de iniciação, como as praxes académicas, foram aniquiladas pelos pruridos dos politicamente correctos.
Qual o preço que se paga quando não passamos por estas experiências de transição?
As crises de identidade e outros conflitos interiores arrastam-se por mais uns anos...
Toda uma série de ajustamentos que deveriam ocorrer mais ou menos naturalmente acabam por se revelar mais dificeis.
Algumas vezes as famílias dos noivos ficam endividadas.
Um desperdício?
Ao fim dos três dias todos os intervenientes interiorizaram o facto de que aqueles dois jovens se casaram e entraram numa nova etapa das suas vidas.
Muitos ajustes que se iriam realizar ao longo de uma década entre os noivos e as suas famílias foram realizados em poucas horas, num ambiente bastante mais propício, enquanto cantavam, comiam e dançavam.
Esses ajustes podem gastar muita energia, muito tempo e muito dinheiro.
Talvez o gasto tenha sido um bom investimento...
Na nossa sociedade o casamento era essencialmente uma cerimónia centrada na noiva. O seu dia de glória. Em troca ela abdicava da sua identidade em prole da harmonia da sua futura família. Para o resto da sua vida.
É claro que se uma cerimónia do casamento já não cumpre nenhum propósito e se transforma apenas em mais uma forma de consumismo, mais vale guardar a massa para outro fim.
A transição mais importante das nossas vidas é a entrada na idade adulta.
Esta transição era acompanhada de rituais que nos ajudavam a compreender e ajustar a essas mudanças. Nalgumas sociedades as crianças eram ritualmente raptadas das suas familias, era-lhes dado a conhecer os segredos da tribo e da vida adulta. Chegar à idade adulta era considerado algo inquestionavelmente positivo. Nunca mais se falava nisso.
A nossa sociedade acabou com a maioria desses rituais. Os segredos da tribo já não se podem transmitir numa semana ou num mês. Já não se ordenam cavaleiros nem se cumpre o serviço militar obrigatório. Até as mais elementares cerimónias de iniciação, como as praxes académicas, foram aniquiladas pelos pruridos dos politicamente correctos.
As experiências associadas a terminar a quarta classe, o ensino secundário ou uma licenciatura cumpriam modestamente esse papel. Já não é o caso. A entrada na idade adulta atrasou-se tanto que um doutoramento acaba por algumas vezes cumprir as funções de um rito de passagem. Quando não é uma forma de atrasar por mais uns anos o contacto com as responsabilidades da idade adulta...
Qual o preço que se paga quando não passamos por estas experiências de transição?
As crises de identidade e outros conflitos interiores arrastam-se por mais uns anos...
Toda uma série de ajustamentos que deveriam ocorrer mais ou menos naturalmente acabam por se revelar mais dificeis.
quinta-feira, abril 16
quarta-feira, abril 15
Muscular Activation Technique
Vai para um ano e meio estava a fazer a invertida antes da aula de Yoga começar. Começaram a dizer-me: estás inclinado para a direita! para a esquerda. Quando a torre inclinada de Pisa caiu nada de mais parecia ter acontecido. Passei a noite seguinte deitado de costas, com as pernas dobradas em cima de um banco. Umas idas ao fisioterapeuta e as dores maiores desapareceram, mas o problema ficou por resolver. Nem a fisioterapia, nem a osteopatia nem as aulas individuais de Pilates resolveram o problema. Qualquer destas técnicas funciona muito bem em certos casos. Não neste.
Estou finalmente a ver uma luz ao fundo do tunel. Numa sessão típica de MAT faz-se uma série de testes. Vamos a um exemplo. Deitado de costas na marquesa, pedem-me para deslizar a perna direita para a direita sem a levantar. Agora tenho de resistir a uma pressão feita da direita para a esquerda no pé. Por incrível que pareça, não consigo oferecer qualquer resistência. O músculo que devia fazer o trabalho, o glúteo direito, está a fazer greve. Não há problema, espetam-me um dedo algures na zona lombar junto à coluna. Oscila entre o desagradável e o altamente doloroso. Um minuto mais tarde, o meu glúteo já sabe o que fazer para resistir à pressão. Agora vamos repetir o teste, com a cabeça levantada. Volto a não conseguir resistir. Agora enfiam-me o dedo algures entre a traqueia e a coluna, novamente com bons resultados. Agora vamos fazer o mesmo teste, mas pressionando a marquesa com a nuca. A história repete-se.
Depois passa-se para outro teste, e mais outro. Volta-se na semana seguinte, para ver como é que as mudanças foram assimiladas. Verifica-se que progressos foram consolidados, o que se perdeu. Procura-se avançar na compreensão do puzzle.
O que é que mais me surpreendeu? A natureza quase milagrosa da técnica? Talvez a pouca diferença que parece existir entre o meu corpo e uma máquina.
Descartes diria: pois claro, o corpo é uma máquina, mas o homem é sobretudo a sua alma. Apesar de tudo, não estou tão seguro de que o corpo seja uma máquina tão simples como o meu relato poderá dar a entender. Por outro lado, não estou certo de o espírito não ter os seus aspectos roboticos. Quando se estimula uma certa parte do cérebro com um eléctrodo, revivemos as sensações e as emoções que sentimos num certo momento das nossas vidas. Não nos limitamos a relembrá-las. Acredito plenamente que existe algo de único e especial em cada ser humano, mas é preciso procurar bem fundo para o encontrar.
Não vejo por isso grande razão para me sentir diminuído se uma boa parte do meu comportamento for reduzida a umas combinações de estereótipos. Afinal eu compartilho boa parte do meu código genético com os chimpanzés, os periquitos e as osgas.
Estou finalmente a ver uma luz ao fundo do tunel. Numa sessão típica de MAT faz-se uma série de testes. Vamos a um exemplo. Deitado de costas na marquesa, pedem-me para deslizar a perna direita para a direita sem a levantar. Agora tenho de resistir a uma pressão feita da direita para a esquerda no pé. Por incrível que pareça, não consigo oferecer qualquer resistência. O músculo que devia fazer o trabalho, o glúteo direito, está a fazer greve. Não há problema, espetam-me um dedo algures na zona lombar junto à coluna. Oscila entre o desagradável e o altamente doloroso. Um minuto mais tarde, o meu glúteo já sabe o que fazer para resistir à pressão. Agora vamos repetir o teste, com a cabeça levantada. Volto a não conseguir resistir. Agora enfiam-me o dedo algures entre a traqueia e a coluna, novamente com bons resultados. Agora vamos fazer o mesmo teste, mas pressionando a marquesa com a nuca. A história repete-se.
Depois passa-se para outro teste, e mais outro. Volta-se na semana seguinte, para ver como é que as mudanças foram assimiladas. Verifica-se que progressos foram consolidados, o que se perdeu. Procura-se avançar na compreensão do puzzle.
O que é que mais me surpreendeu? A natureza quase milagrosa da técnica? Talvez a pouca diferença que parece existir entre o meu corpo e uma máquina.
Descartes diria: pois claro, o corpo é uma máquina, mas o homem é sobretudo a sua alma. Apesar de tudo, não estou tão seguro de que o corpo seja uma máquina tão simples como o meu relato poderá dar a entender. Por outro lado, não estou certo de o espírito não ter os seus aspectos roboticos. Quando se estimula uma certa parte do cérebro com um eléctrodo, revivemos as sensações e as emoções que sentimos num certo momento das nossas vidas. Não nos limitamos a relembrá-las. Acredito plenamente que existe algo de único e especial em cada ser humano, mas é preciso procurar bem fundo para o encontrar.
Não vejo por isso grande razão para me sentir diminuído se uma boa parte do meu comportamento for reduzida a umas combinações de estereótipos. Afinal eu compartilho boa parte do meu código genético com os chimpanzés, os periquitos e as osgas.
segunda-feira, abril 13
A Crítica da Razão Pura
Ao longo das nossas vidas vamos desenvolvendo uma "filosofia espontânea". Muitas das ideias que julgamos serem nossas são pedaços de teorias desenvolvidas uns séculos atrás por algum filosofo de quem eventualmente nunca ouvimos falar. Por exemplo: a visão de muitos de nós sobre a forma como interagimos com o mundo remonta aos pontos de vista introduzidos por Descartes na primeira metade do século XVII ou por David Hume na primeira metade do século XVIII.
Descartes criou o dualismo alma corpo. Penso, logo existo significa que somos primeiro que tudo seres pensantes. Deus não nos enganaria, portanto as nossas percepções são realmente a indicação da existência do mundo exterior. Os seus sucessores usaram Deus e a alma para resolver de forma simplista todos os problemas epistemológicos que se lhes apresentaram.
Um réptil ao nascer está quase preparado para a vida. Uma série de instintos determinam a sua vida e estão prontos a utilizar mal ele sai do ovo. Nos mamíferos a aprendizagem desempenha um papel crescente. Um bebé ao nascer parece quase completamente por formar. É uma esponja que vai absorver os estímulos do meio, os quais terão uma importância decisiva na sua formação. Dá a impressão de que não existe qualquer tipo de estruturação na sua mente.
Hume acredita na plasticidade infinita da mente humana, tal como a maioria dos psicólogos actuais. Para Hume as ideias que orientam a nossa vida são o resultado da acumulação dos estímulos exteriores. Há uma variação quase infinita e inclassificável de padrões no comportamento humano, por oposição à estreiteza das variações que encontramos no comportamento animal, pré-determinado pelos instintos. A vitória do cepticismo de Hume consistiu em mostrar as limitações do pensamento pós-cartesiano. Por outro lado Hume nunca consegui explicar a noção de causalidade ou a possibilidade do raciocínio lógico.
Quando aos 46 anos Kant apresentou a sua dissertação inaugural enquanto professor em Konigsberg, Kant recebeu uma carta do seu aluno Markus Herz. Herz lembrou a Kant que ele se tinha esquecido de explicar como é que o ser humano recebia a informação do mundo exterior e a processava. Durante onze anos Kant meditou nesta questão. Herz e Hume acordaram-no do seu sonho dogmático. A obra prima de Kant é o produto desses onze anos de meditação. É tão complexa que dois séculos não foram suficientes para que as suas ideias percorressem o caminho que as separam do senso comum. Sendo a mais importante obra da história da filosofia, penso que vale a pena tentar transmitir aqui uma parte do seu sabor.
Noam Chomksy foi o mais importante linguista do século XX. A influencia decisiva da sua obra abrange áreas tão diversas como a Psicologia e a Teoria da Computação. A gramática generativa de Chomsky descreve todas as línguas existentes. Cada língua conhecida pode ser obtida a partir duma língua base fixando certos parâmetros. A teoria de Chomsky pressupõe a existência a priori de uma linguagem universal que nós nascemos programados para falar, descrita por ele. Esta é uma das teorias científicas que põe limites à infinita plasticidade da mente humana.
Suponham que vêem no ecrã do vosso computador duas bolas pretas em fundo branco. A bola que está do lado esquerdo desloca-se para a direita, quando as duas bolas se tocam a bola esquerda para e a bola direita move-se para a direita. O nosso cérebro será levado a crer que o movimento da segunda bola foi provocado pelo da primeira. Porquê? Simplificando radicalmente as coisas, Kant considera que o ser humano é uma "máquina programada" para pensar segunda certas regras de causalidade. As noções de causalidade, espaço e tempo, entre outras, estão "programadas" na nossa mente independente de qualquer realidade exterior. São os instrumentos que usamos para lidar com o mundo.
Kant consegue assim fundamentar a ciência sem cair nas ingenuidades de Descartes e mantendo vivo o cepticismo de Hume.
Freud e Jung introduziram definitivamente o conceito de inconsciente nas nossas vidas. O inconsciente é mais uma limitação à infinita plasticidade da mente humana. Em especial o inconsciente Jungiano. É por isso que descrever certos aspectos do comportamento humano através de uma combinatória finita talvez não seja assim tão imbecil.
Há ainda um problema com todas estas teorias. Não se conseguiu ainda fundamentar em termos genéticos a teoria de Chomsky ou a filosofia de Kant. A Teoria da Evolução também terá aqui uma palavra a dizer. A seu tempo lá chegaremos.
Descartes criou o dualismo alma corpo. Penso, logo existo significa que somos primeiro que tudo seres pensantes. Deus não nos enganaria, portanto as nossas percepções são realmente a indicação da existência do mundo exterior. Os seus sucessores usaram Deus e a alma para resolver de forma simplista todos os problemas epistemológicos que se lhes apresentaram.
Um réptil ao nascer está quase preparado para a vida. Uma série de instintos determinam a sua vida e estão prontos a utilizar mal ele sai do ovo. Nos mamíferos a aprendizagem desempenha um papel crescente. Um bebé ao nascer parece quase completamente por formar. É uma esponja que vai absorver os estímulos do meio, os quais terão uma importância decisiva na sua formação. Dá a impressão de que não existe qualquer tipo de estruturação na sua mente.
Hume acredita na plasticidade infinita da mente humana, tal como a maioria dos psicólogos actuais. Para Hume as ideias que orientam a nossa vida são o resultado da acumulação dos estímulos exteriores. Há uma variação quase infinita e inclassificável de padrões no comportamento humano, por oposição à estreiteza das variações que encontramos no comportamento animal, pré-determinado pelos instintos. A vitória do cepticismo de Hume consistiu em mostrar as limitações do pensamento pós-cartesiano. Por outro lado Hume nunca consegui explicar a noção de causalidade ou a possibilidade do raciocínio lógico.
Quando aos 46 anos Kant apresentou a sua dissertação inaugural enquanto professor em Konigsberg, Kant recebeu uma carta do seu aluno Markus Herz. Herz lembrou a Kant que ele se tinha esquecido de explicar como é que o ser humano recebia a informação do mundo exterior e a processava. Durante onze anos Kant meditou nesta questão. Herz e Hume acordaram-no do seu sonho dogmático. A obra prima de Kant é o produto desses onze anos de meditação. É tão complexa que dois séculos não foram suficientes para que as suas ideias percorressem o caminho que as separam do senso comum. Sendo a mais importante obra da história da filosofia, penso que vale a pena tentar transmitir aqui uma parte do seu sabor.
Noam Chomksy foi o mais importante linguista do século XX. A influencia decisiva da sua obra abrange áreas tão diversas como a Psicologia e a Teoria da Computação. A gramática generativa de Chomsky descreve todas as línguas existentes. Cada língua conhecida pode ser obtida a partir duma língua base fixando certos parâmetros. A teoria de Chomsky pressupõe a existência a priori de uma linguagem universal que nós nascemos programados para falar, descrita por ele. Esta é uma das teorias científicas que põe limites à infinita plasticidade da mente humana.
Suponham que vêem no ecrã do vosso computador duas bolas pretas em fundo branco. A bola que está do lado esquerdo desloca-se para a direita, quando as duas bolas se tocam a bola esquerda para e a bola direita move-se para a direita. O nosso cérebro será levado a crer que o movimento da segunda bola foi provocado pelo da primeira. Porquê? Simplificando radicalmente as coisas, Kant considera que o ser humano é uma "máquina programada" para pensar segunda certas regras de causalidade. As noções de causalidade, espaço e tempo, entre outras, estão "programadas" na nossa mente independente de qualquer realidade exterior. São os instrumentos que usamos para lidar com o mundo.
Kant consegue assim fundamentar a ciência sem cair nas ingenuidades de Descartes e mantendo vivo o cepticismo de Hume.
Freud e Jung introduziram definitivamente o conceito de inconsciente nas nossas vidas. O inconsciente é mais uma limitação à infinita plasticidade da mente humana. Em especial o inconsciente Jungiano. É por isso que descrever certos aspectos do comportamento humano através de uma combinatória finita talvez não seja assim tão imbecil.
Há ainda um problema com todas estas teorias. Não se conseguiu ainda fundamentar em termos genéticos a teoria de Chomsky ou a filosofia de Kant. A Teoria da Evolução também terá aqui uma palavra a dizer. A seu tempo lá chegaremos.
domingo, abril 5
sexta-feira, abril 3
O Guerreiro
Algumas vezes temos de ficar e lutar. Sempre foi assim ao longo da história da humanidade. Era matar ou ser morto. Um homem só contava se era um guerreiro. Mas o guerreiro não tem de matar para defender os seus valores. O guerreiro sabe afirmar o seu poder e assumir a sua identidade no mundo. Esse poder pode ser físico, psicologico, intelectual ou espiritual. Luta-se para subir no emprego. Também se luta para engravidar ou para ultrapassar um limitação pessoal.
Se o martir enfrenta a dor e o viajante a solidão, o guerreiro enfrenta o medo. Só se consegue viver plenamente um destes arquetipos quando já se conhecem razoavelmente bem os outros. Para enfrentar o medo, temos de saber lidar com a dor e a solidão.
Durante milénios poucas guerreiras existiram. Felizmente as coisas mudaram. Por outro lado, conheço bastantes senhoras da classe média alta que não concebem outra forma de estar na vida que não seja comportarem-se como guerreiras. Pelo menos a partir do momento que saiem da garagem do prédio onde vivem. Um dia descobrem que o marido não é perfeito. Quando dão por elas já estão divorciadas. Algumas vezes por coisa nenhuma...
Se o martir enfrenta a dor e o viajante a solidão, o guerreiro enfrenta o medo. Só se consegue viver plenamente um destes arquetipos quando já se conhecem razoavelmente bem os outros. Para enfrentar o medo, temos de saber lidar com a dor e a solidão.
Durante milénios poucas guerreiras existiram. Felizmente as coisas mudaram. Por outro lado, conheço bastantes senhoras da classe média alta que não concebem outra forma de estar na vida que não seja comportarem-se como guerreiras. Pelo menos a partir do momento que saiem da garagem do prédio onde vivem. Um dia descobrem que o marido não é perfeito. Quando dão por elas já estão divorciadas. Algumas vezes por coisa nenhuma...
quarta-feira, abril 1
A Inclita Geração
Todos os filhos de João primeiro e Philippa de Lancaster se distinguiram de alguma forma. Fernando, o Infante Santo, morre no cativeiro em Fez, depois de recusar entregar Ceuta em troca da sua própria liberdade. Pedro foi um nobre excepcionalmente culto para a época tendo viajado incansavelmente por toda a Europa. João foi o condestável do reino, sucedendo a o grande Nuno Álvares Pereira. Henrique, o Navegador, foi o mágico que reformulou o projecto nacional, quando os Algarves já estavam conquistados e invadir o norte de África não se revelou viavel. Tal como Fernando foi o mártir, Pedro o peregrino e João o guerreiro. Este mito foi contado de geração em geração a todos os míudos que não tinham hipótese de vir a ser reis, como Duarte, o filho mais velho. Muitos aprenderam alguma coisa com ele.
Umas gerações depois, este mito foi completamente ofuscado pelo mito d'O desejado, que havia de voltar num manhã de nevoeiro. O mito que simboliza a transformação desta terra num país de orfãos.
Umas gerações depois, este mito foi completamente ofuscado pelo mito d'O desejado, que havia de voltar num manhã de nevoeiro. O mito que simboliza a transformação desta terra num país de orfãos.
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