sexta-feira, janeiro 20

Caridade (5): um conto científico

(começou aqui) (continua daqui)

Enquanto aguarda a resposta do John, o Luís recorda a conversa que tiveram em Lisboa. Por um instante julgara ter encontrado no John o pai espiritual que tão desesperadamente procurava. Tinha sido um tremendo choque conceber meia hora mais tarde que o grande John Mawhinsky o estava a aldrabar. Seis meses depois, muita coisa tinha acontecido. Ali estava ele a pedir ao John para o ajudar no artigo. Tinha-se preparado para todas as possíveis respostas do John, menos para aquele interminavel silêncio displicente. O Luís tinha chegado ao limite das suas forças. Resolveu ser ouvido em confissão.
You know, John...
Contou-lhe a fúria que o tinha levado a cometer meia dúzia de infracções graves ao codigo da estrada, na esperança de o apanhar na Gare do Oriente. O John parecia não ter ouvido nada. Ele continuou.
O Luís continua a fazer o balanço dos últimos seis meses. Uma semana depois da conferência do John, a sua raiva já tinha acalmado. Começou a fazer uns calculos. Pouco a pouco foi compreendendo melhor o problema em que não tinha conseguido o mínimo progresso durante os três meses anteriores. Levou um mês a arquitectar uma estratégia para provar o teorema. Compreendeu então que tudo o que tinha feito tinha sido inspirado na conversa com o John. A ideia do John continha um erro trivial, mas era uma metáfora que apontava na direcção correcta. A série formal divergia, mas podíamos provar a existência de uma solução com um teorema de ponto fixo. Cada raciocínio algébrico elementar proposto pelo John tinha um equivalente topológico bastante mais sofisticado que fazia a estratégia funcionar!
Foi nessa altura que o Luís descobriu um buraco na prova. Tentou resolver o problema durante meses, sem sucesso. Estava certo que o teorema era verdadeiro, mas não sabia como prová-lo. O John saberia o que fazer.
Mawhinsky levantou os olhos e sorriu. Devias ter um pouco mais de caridade pelas ideias dos outros!
E voltou a ajeitar a meia direita.
O Lino desce as escadas e procura discretamente uma poltrona no canto oposto da sala.
Em Carcavelos, a Matilde entra no seu banho de espuma.

(continua aqui)

12 comentários:

Anónimo disse...

E quando é que o Mathieu encontra o Brunet?

Orlando disse...

?
Já não me lembro nada dos romances do Sartre...

Orlando disse...

Descansa que não falta muito...

/me disse...

Ui, não vais entrar por Teoria das Categorias dentro, espero?

Anónimo disse...

Mas andam para aí influências... A técnica da simultaneidade.

Anónimo disse...

Que ele roubou ao dos Passos, não te preocupes.

Sofia disse...

Faz a Matilde cair na banheira e partir uma perna, faz... :)

Orlando disse...

Se tu insistes...

Sofia disse...

Desde que o médico seja o George Clooney...

Sofia disse...

Ah, desculpa! O George não entra na novela e não está previsto que entrem mais personagens... Que pena. Ao menos, podia o enredo ficar mais... digamos... Onde anda o OMWO??!

António Araújo disse...

Quem profere o meu nome em vão?

Anónimo disse...

Ah, eu prefiro o teu nome em português!