segunda-feira, maio 18

Mais uns quantos estereótipos

Podemos assistir ao longo dos tempos a um "conflito dialéctico" entre as posições políticas mais conservadoras e as mais progressistas. Parece-me claro que ninguém tem propriamente razão. A situação tem evoluído de formas por vezes bem inesperadas. Quando escrevi este post comparava as oposições direita/esquerda e crentes/ateus. Neste segundo caso não conseguia imaginar como é que a razão podia ser de alguma forma partilhada pelos dois lados. Era essa a ideia principal que queria exprimir. O post foi um flop. Quando a Madi apareceu a comentar, o que não fazia há muito tempo, senti-me na obrigação de dizer que

não se nota nada mas isto ( o blog) vai avançando. É preciso olhar com muita atenção.

A verdade é que estávamos a ter mais uma estúpida guerra crentes/descrentes. Vamos lá a ver se a perspectiva que se segue muda alguma coisa. Pelo menos não agrada gregos ou a troianos, o que já não é mau.

Digamos que existem pelo menos cinco níveis de consciência humana.

1. Não temos uma consciência clara da fronteira entre nós e o mundo que nos rodeia. Uma criança de colo não distingue claramente onde é que ela acaba e a sua mãe começa. Todos nós podemos ter recaídas a este nível. Quantas pessoas ficam doentes quando o seu carro tem um problema ou o seu clube perde um jogo.

2. Passamos a diferenciar as nossas percepções daquilo que percepcionamos. Deixamos de nos projectar sobre tudo o que nos rodeia. Passamos a projectar partes de nós sobre algumas pessoas que nos rodeiam. Uma criança acha que a mãe sabe tudo e pode fazer milagres, que o pai tudo pode fazer e é o homem mais forte do mundo. Na adolescência essas projecções passam a recair sobre os amigos mais velhos e as estrelas rock. Os pais passam a não saber nada de nada. Os adultos voltam a realizar este tipo de projecções sempre que se apaixonam.

3. Nesta fase a omnipotência e a omnisciência já não são projectadas sobre pessoas mas sobre entidades abstractas (princípios, símbolos ou ensinamentos) ou instituições: Deus, o Destino, a Verdade. Torna-se possível o pensamento teológico e filosófico. Nas formas mais primitivas deste nível Deus encarna ainda as funções dos pais, sendo-lhes atribuído o poder de punir ou recompensar as pessoas de forma antropomórfica.
Nesta fase deixamos de nos guiar ao sabor da emoção do momento e da empatia inconsciente, passando a seguir regras e valores. Passamos a fazer aquilo que achamos correcto do ponto de vista ecológico não porque ficamos doentes de raiva quando testemunhamos a destruição da natureza mas devido a um imperativo moral que faz parte de um conjunto de valores razoavelmente coerente.

4. Dá-se a extinção radical das projecções. Deixa de existir um sentido a priori na vida. Deixa-se de acreditar na imortalidade. Dá-se um passo em frente no sentido da objectividade. Funciona? passa a ser a questão fundamental. Vê-se a relatividade dos princípios em que se acredita. Os valores pessoais são expressos em termos de talvez, não tenho a certeza. O ateísmo pode ou não ser completamente assumido.
O estádio 4 é altamente perigoso. Aquilo que se ganhou em clareza nem sempre é compensado por aquilo que se perdeu em significado. Muitas pessoas conseguem viver lidar com este estádio de consciência, mantendo uma real ou aparente estabilidade. Outras acabam por regredir para estádios mais primitivos ou passar por neuroses graves. Uma sociedade onde uma boa parte da elite está no nível quatro está condenada a passar por dificuldades graves. Estas pessoas acabam por de alguma forma minar a crença das restantes pessoas, sem lhes apresentar alternativas que lhes sirvam.

5. Que fazer quando nos apercebemos dos problemas criados pelo nível quatro? Que tal uma revolução coperniciana? Tal como a Terra não é o centro do mundo, talvez o Ego não seja o centro da nossa personalidade. Talvez seja apenas a ponte de um grande iceberg mergulhado no nosso inconsciente. Mergulhando nesse oceano, talvez encontremos algo que dê um significado às nossas vidas. Talvez até seja algo parecido com aquilo que muitas religiões afirmam. E também bastante diferente.

8 comentários:

Sofia disse...

:)
Muda, On.
O caminho é mesmo esse; O caminho do "Talvez".
Não existe verdade mais absoluta que a verdade do "Talvez". Não existe verdade mais verdadeira que um sincero "Logo se vê".

on disse...

Sofia,
é optimo, o talvez, quando o descobrimos. E por mais uns tempos. Mas chega o dia em que o talvez já não chega...

Sofia disse...

Não pode ser, On :)
Para quê ir além do talvez? Isso seria levar a vida demasiado a sério e querer mudar o Mundo, pô-lo perfeito. E tal aspiração implicaria chorar perante a imagem de uma leoa a caçar a cria de uma gazela e perder a vontade de fazer o que quer que fosse depois da fome de uma criança...
Não pode ser, On.

on disse...

Sofia,
"chorar perante a imagem de uma leoa a caçar a cria de uma gazela e perder a vontade de fazer o que quer que fosse depois da fome de uma criança" são identificações de nível um:)

Anónimo disse...

Por outro lado, tens alguma razão. Trata-se de não deixar que a logica esmage o sentimento. I can live with that...

MaDi disse...

Há alguém conheças que está no nível 5?

Acho que pouca gente encontra o caminho para o nível 5. A solução encontrada no nível 4 acaba por ser visitar de vez em quando os níveis 3, 2 e 1 para não se dar em doido...

Orlando disse...

Madi,
não conheço pessoalmente ninguém que tenha ultrapassado os problemas do nível quatro.
Conheço algumas pessoas que fazem por isso.

Tens toda a razão, mas essas regressões são soluções muito limitadas.

MaDi disse...

Nós somos limitados! :)