sábado, outubro 16

Capitalismo, a outra utopia

Há indícios de que a procissão dos bancos (principalmente nos EUA) ainda vai no adro, pois foi avistado mais um cisne negro lá para as bandas das MBS:

The Second Leg Down of America’s Death Spiral
The Wheels Are Coming Off in MBS Land: All 50 State AGs Join Probe;
Banks Abandoning MERS Foreclosures.
AD

O meu desejo não é de todo o colapso dos EUA ou da Europa, que, maus que possam ser, são ainda do melhor que temos nesta esterqueira. Não vejo com bons olhos a mudança do primeiro plano para a China ou afins, e muito menos um colapso generalizado. Roma , sendo Roma, é melhor que a barbárie. Sou daqueles papalvos que acreditam na civilização ocidental e não quero ver as bibliotecas em ruínas (agora, a "city", ou Wall Street, can both cry me a river).
Seria até a favor dos bail-outs se achasse que funcionavam, injustos como são. Mas acho que não funcionam, e que aumentar a magnitude do colapso quando ele ocorrer. Parece-me que há um ciclo crescente: Quando o Long term capital management rebentou, disseram que tinha que ser salvo porque podia fazer ruir o sistema financeiro. O bail-out foi de 5 bilioes, ou algo assim, organizado por outras instituições financeiras. Sabendo o que sabemos hoje, dá para levar a sério que isso teria causado o tal colapso global? Ou que simplesmente serviu para salvar uns amigos que tinham que ser salvos?
Desde então temos progredido de bolha em bolha, de bail-out em bail-out, e os números e as instituições em risco, e o tamanho dos bail-outs só cresce. Desta vez mede-se nos triliões de dolares e é a economia mundial que está em risco. O que eu me pergunto é: não teriam as coisas sido diferentes se tivessemos deixado cair o LTC, ou se o Greenspan não tivesse "salvo" a economia após cada bolha? O LTC - um único fundo! - era "too big to fail", diziam. Depois a AIG era "too big to fail" (pergunto-me, se ser "too big" é argumento, porque é que não salvaram o fundo do Madoff), agora, claro, a economia toda é too big to fail, e para salvá-la empenhámos o Estado. Mas o Estado, que é too big to fail, já só pode ser salvo por fundos globais. Será o FMI too big to fail? Estamos nas ultimas décadas na situação de um tipo que tem gangrena num dedo e que não o corta porque não aceita a perda; mas agora a gangrena já vai no pescoço, e chegamos ao ponto em que cortar já nem é uma opção.
Não existia nada "too big to fail". Isso não é compatível com o capitalismo. O que havia era instituições à frente das quais estavam pessoas com amigos nos lugares certos. O que havia era interesses que não podiam ser lesados, e para os salvar alastrou-se o dano exponencialmente, porque o estado inteiro tem que cair antes que os seus donos possam descer dos seus poleiros. Num sistema capitalista os incompetentes teriam falido antes de serem too big to fail, e os mais capazes teriam tomado o seu lugar. Em vez disso temos o Estado a pagar para perpetuar como lideres de mercado os falhados do mesmo.

Se acham que estou a dramatizar com "as bibliotecas em ruínas", vejam o que se passa no Reino Unido. Redução de 80% nos fundos para o ensino superior. Todo o género de cursos a fechar, e investigadores em migração. Estamos a falar do Reino Unido, a perda de património intelectual é catastrófica. Que miserável estado de coisas quando a maralha da city for too big to fail e o Queens College for um luxo descartável. Confesso que sempre que passei pela City e vi a maralhada pedante sempre apressada nos seus fatinhos (ou, mais terra a terra, certos putos pedantes do ISCTE que se acham sumidades mas não conseguem sequer fazer as suas somas na cadeira de contabilidade) sentia-me no meio de um daqueles filmes de zombies que estão a voltar à moda. Agora já sei porquê. Aquela gula toda tinha que acabar em mastigação de cérebros.
A.

Socrates versus Socrates

Prozacland

Mais do que nunca, o título do blog faz sentido. E o primeiro post tornou-se actual.

muitos portugueses já têm ou terão dificuldades em manter o seu nível de vida e sobretudo a sua auto estima. Este blog pretende discutir estratégias pessoais e políticas para lidar com este problema
(Tenho que ir reler os posts para ver se realmente postei algo sobre isto).

Que fazer?

Votar, votar aonde? Tudo o que precisamos de saber sobre política está num episódio dos Simpsons. Os Kang raptaram Homer para saber quem manda no mundo. Ele explica: o presidente dos Estados Unidos, que é eleito dentro de um mês. Os dois extraterrestes tomam o lugar dos candidatos. Homer consegue fugir e desmascara-os. Eles riem-se. São os únicos candidatos, o povo nada mais pode fazer do que escolher um deles. Os nossos Kang são o PS e o PSD. Podemos votar em mais três partidos, mas não faz grande diferença. Um dos dois ganha.

P.S. É engraçado como quase todos os meus amigos que não costumam votar, agora mudaram de ideias. Um até já me manda abaixo-assinados por mail.

segunda-feira, outubro 4

domingo, outubro 3

Triste República - Viva a República

Dificilmente o centenário da proclamação da Res pública, do governo pelo povo, poderia ser celebrado em piores circunstâncias. Nem o Povo nem os governantes mandam. A situação não é tão depressiva como nos tempos do Ultimato. Alguns dirão que para lá caminha.
Dito isto, confesso-me um ardente republicano. Ainda me lembro da última vez que fui a um mui conceituado instituto de investigação espanhol. Andavam a pintar paredes para receber A Infanta. Era da capacidade dos membros do instituto em adular a senhora, que de ciência não sabe a ponta dum corno, que dependia uma boa parte dos financiamentos da casa.
Viva a República!

sábado, outubro 2

Pensar mais, pensar melhor

A Globalização e a Moeda Única mergulharam Portugal numa crise estrutural. Só um esforço colectivo nos permitirá sair da situação em que nos encontramos. A classe média tem um papel decisivo a desempenhar na reinvenção do país. Descobriu o voto flutuante. Tornou-se mais sofisticada, permitindo que algumas empresas portuguesas lançassem com êxito produtos inovadores a nível mundial. Continua pouco esclarecida. Basta olhar para os anúncios dos produtos financeiros lançados pelos nossos bancos para o confirmar: PPR's que dão abatimentos no IRS no primeiro ano e rendimentos miseráveis nos anos seguintes, depósitos a prazo que dão um juro alto no último mês mas um juro médio ridículo. Como podemos transformar a nossa classe média?

A Inglaterra foi durante séculos o modelo que procurámos emular sempre que enfrentámos problemas. Nas últimas décadas esse papel passou a ser desempenhado pelos países nórdicos. Nunca nos preocupámos demasiado em tentar compreender quais os mecanismos que transformaram estas sociedades naquilo que são hoje. Há uma constante nos sistemas educativos destes países que ignoramos sistematicamente: o ênfase na aprendizagem do Pensamento Crítico nos ensinos secundário e universitário.

Um adolescente finlandês sabe reconhecer as falácias de raciocínio mais óbvias, aquelas que usamos todos os dias. Sabe identificar as hipóteses assumidas implicitamente pelo seu interlocutor e avaliar a sua credibilidade. Conhece os truques mais óbvios que se usam quando se quer concluir aquilo que mais nos convém de um conjunto de dados estatísticos. Reconhece facilmente uma tentativa de manipular as suas emoções de forma a mudar as suas opiniões. Quando chega ao mercado de trabalho este jovem sabe organizar as suas ideias e expô-las de forma articulada. Processa as críticas que lhe são feitas de forma racional, não as tomando como ataques pessoais. É difícil exagerar as vantagens comparativas de uma sociedade com uma percentagem significativa de membros que domina este tipo de competências. Basta lembrar que uma sociedade tem, sempre, os políticos que merece.

Não deveria o ensino da Matemática e da Física desenvolver pelo menos algumas destas capacidades? Com certeza que sim. Acontece que ao estudar ciências exactas estamos a lidar com objectos desligados das nossas emoções, o que facilita consideravelmente uma abordagem racional dos problemas. Numa língua natural a maior parte das afirmações que fazemos subentendem muitas outras afirmações não explicitadas. Há muito mais espaço para o nosso inconsciente tomar as rédeas dos acontecimentos. Pensar no dia-a-dia de forma racional exige uma disciplina que dificilmente pode ser adquirida fora dos bancos da escola. Existe uma relação de simbiose entre o ensino das Ciências Exactas e o ensino do Pensamento Crítico. As Ciências Exactas criam os hábitos de raciocínio que facilitam de forma decisiva a aprendizagem do Pensamento Crítico. Um jovem que aprende a pensar melhor no dia-a-dia vai melhorar significativamente os seus resultados a Matemática.

A Classe Média é um estrato social que se define mais pelas capacidades intelectuais do que pelo rendimento disponível. Introduzir o ensino do Pensamento Crítico no Ensino Secundário português seria uma contribuição importante para criar a médio prazo uma classe média capaz de gerar as elites, criar as dinâmicas e fazer as escolhas que nos permitirão ultrapassar os nossos problemas estruturais.

Perigoso, perigoso, é implementar ideias. O estudo do Pensamento Crítico está a ser introduzido no ensino universitário. Já existe uma cadeira de Pensamento Crítico na licenciatura em Informática da Universidade Nova e uma cadeira de opção de Pensamento Crítico nas licenciaturas da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.